Em “A Testemunha”, cujo roteiro é assinado pelo renomado Jafar Panahi e Nader Saeivar, que também dirige a obra, uma professora de dança aposentada testemunha o assassinato de uma de suas ex-alunas pelo marido. Em um país onde as instituições são civilizadas, após a denúncia, o criminoso rapidamente seria levado a julgamento e, posteriormente, encarcerado. No entanto, no Irã, as leis favorecem absurdamente os homens, concedendo-lhes até o direito de assassinar a esposa em caso de traição. A infeliz professora, portanto, precisa esforçar-se para provar que aquele marido, um empresário abastado, cometeu o crime, mas sua voz é sistematicamente ignorada, especialmente em virtude de seu passado de militância sindical, que a torna alvo constante da vigilância policial.
O roteiro de Panahi e Saeivar retrata o sofrimento das mulheres iranianas enquanto presta homenagem às jovens que, na vida real, foram assassinadas pelo governo após publicarem suas danças na internet. Elas dançaram e expuseram suas cabeças sem o hijab como forma de resistência à opressão. A personagem do filme também publica um vídeo e é morta em consequência disso. A partir desse momento, inicia-se uma crescente tensão, onde a figura masculina se transforma em uma ameaça constante ou simboliza a infantilidade, como na cena em que ocorre uma briga física por conta de um desentendimento no trânsito. A mulher que testemunha a cena observa tudo com um olhar vazio, como se não visse mais saída para sua situação em um país dominado por crianças mimadas e criminosos.
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Diante de todo esse martírio, do segundo ato em diante, desenha-se uma resolução um tanto óbvia para os problemas da protagonista, mas que, felizmente, não se concretiza. Trata-se apenas de uma armadilha do texto para brincar com a percepção do espectador menos atento, uma vez que várias pistas são deixadas na tela. No entanto, como mencionado, pela competência com que tudo é conduzido até este momento, seria ilógico seguir pelo caminho mais fácil, que poderia agradar parte dos espectadores, mas que tiraria do filme sua força.
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Assim, “A Testemunha” é mais um bom exemplar do cinema iraniano que denuncia as atrocidades de uma sociedade ditatorial brutal e busca indicar uma saída que não reside na vingança ou em mais mortes, mas na própria arte, seja ela expressa pelos corpos das dançarinas ou pelas câmeras dos cineastas. Por isso, pode-se afirmar que se trata de uma obra pacifista, que não pretende que mais sangue seja derramado, nem pelas mulheres do Irã, nem mesmo por seus perseguidores. Algo louvável em uma realidade na qual o mal é sempre respondido com ainda mais mal.
Filme assistido na 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo
Imagem em Destaque: Divulgação
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