Um filme sensorial
Logo nas primeiras cenas de “Capitu e o Capítulo”, Machado de Assis, o próprio escritor do livro, já nos coloca numa posição de expectadores privilegiados da sua história e pensamentos acerca dos eventos que se revelam na tela.
Porém, não somente com suas impressões, mas também citando outros autores que podem complementar a narrativa ou promover outro ponto de vista da clássica história de Capitu, Bentinho e adjacentes.
O filme, que trata de interrupções, quebra de expectativas, frustração e recompensas (poucas), é muito fragmentado em imagens e sons, que às vezes destoam ou complementam a narrativa.
Essa dicotomia está presente no filme inteiro, pois não há uma estrutura linear, e sim fragmentos da história e momentos isolados de interação entre os personagens, que nem sempre se conectam.
O cineasta Júlio Bressane (de “A Febre do Rato”, “Cleópatra” e “Educação Sentimental”), voltando ao universo de Machado de Assis, pois nos anos 80 filmou “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, faz uma homenagem ao livro, pois como se passa em parte na cabeça dos personagens, há inserção de outros tipos de artes como pinturas, fotografia, imagens e até passagens com citações de nomes na língua Tupi Guarani.
A experiência é interessante e que traz muitos enigmas, como na própria obra, o livro “Dom Casmurro”.
Por exemplo, passagens de imagens do mar, sobrepostas sobre os olhos de Capitu (Fernanda Ximenes) que nos remete a descrição dos “olhos de ressaca” constante no livro, imagens de Bentinho refletidas em espelhos denotando ambiguidade…
Em certos momentos, se torna mais uma experiência sensorial do que visual, o que é o grande mérito do filme, porém em alguns momentos, sendo sincero, não entendi para onde o filme ia, o que me causou confusão, especialmente na cena pós-crédito.
Mas o que é a arte, se não a interpretação de quem a faz e de quem a vê?
Quanto ao valor de produção, entendo que é muito pouco para o que a obra de Machado de Assis representa, com diferença em captações de sons e imagens, mas sabemos como é fazer cinema em nosso país, lembrando toda dificuldade de financiamento e a falta de apoio nos últimos 4 anos em termos de cultura e diversidade de assuntos da nossa arte.
Voltando às citações de autores, entendi como uma tentativa de trazer luz a história de Dom Casmurro como forma de complementar as ações dos personagens, uma visão de fora por assim dizer.
“Capitu e o Capítulo” foi exibido em 2021 em festivais, mas finalmente, essa semana, entra em cartaz.
Se você é fã do livro ou quer adentrar ao universo de Machado de Assis, Capitu, Bentinho e Escobar, pode ser um filme que lhe traga algo mais, além das páginas, para que se tire as próprias conclusões.
Por Roberto Rezende
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