Logo de cara é fácil notar algumas das referências seguidas pelo terror indie “Skinamarink: Canção de Ninar”: “Poltergeist – O Fenômeno” e filmes do subgênero found footage. Em relação ao primeiro, há crianças como vítimas do sobrenatural, além é claro da presença de uma TV que sempre está ligada e que é a única fonte de iluminação em várias cenas. Já sobre o segundo, basta dizer que o conceito é seguido quase à risca. A diferença é a estética do longa de Kyle Edward Ball, que foi pensada para emular um vídeo caseiro em VHS feito na década de 90. Ou seja, as imagens são extremamente granuladas e cheias de defeitos, e o som possui aqueles “estalos” captados pelo limitado microfone acoplado às câmeras amadoras daquela época. Também não há um personagem filmando o tempo todo ou mesmo câmeras de segurança na casa. A perspectiva da câmera é, na maior parte das vezes, o olhar das crianças.
Essas escolhas talvez até possuam uma justificativa: as lembranças de infância de seus realizadores. O problema delas é que, ao mesmo tempo em que servem ao propósito narrativo, elas limitam o número de pessoas que apreciará o filme. Afinal de contas, será muito difícil para o espectador casual, que só vai ao cinema para se divertir, acompanhar a trama cadenciada e ainda com vários “defeitos” que saltam aos olhos nas telas grandes. Haverá, com quase toda a certeza, debandadas dos cinemas e um boca a boca prejudicial à obra. Claro que é possível escolher bem onde ele passará para atingir apenas aqueles cinéfilos ávidos por novas propostas. A seleção das salas caberá à distribuidora.
Mas, e esse cinéfilo, apreciará o resultado depois de uma hora e quarenta de projeção? Bem, pode-se dizer que as intenções de Ball, que também escreve o roteiro, é de fazer algo diferente. E ele consegue em partes, isso porque que falta tensão e medo em um filme que é vendido como terror. Claro que pode se tratar de uma falha na estratégia de marketing aqui no Brasil, que está classificando o filme incorretamente, já que a própria direção segue pelo caminho da sugestão, sem mostrar o “monstro” que atormenta a casa. O que se pede não é sensacionalismo ou pirotecnia barata, e sim a concretização do terror. Há, no lugar disso, muitas panorâmicas sem propósito que vão de um lado ao outro, ou de cima para baixo, para mostrar paredes e cômodos vazios e escuros. As vezes um móvel desaparece ou tudo fica de ponta cabeça, e só.
A direção de câmera, contudo, possui qualidades conceituais inseridas em seu defeitos: há, de fato, muitos cômodos filmados na escuridão, mas, nesses momentos, os lentos ZOONs comandados por Ball e por seu diretor de fotografia Jamie McRae quebram a expectativa ao se aproximar de um ponto de interesse sem se render ao malfadado jumpscare. O roteiro, por sua vez, é sóbrio e não apela aos demônios e duendes habituais. Não é explicado de onde vem o perigo. Na verdade, nem as vitimas são vistas por inteiros; apenas pequenas partes de seus corpos são visíveis, com destaque aos pés. Isso cria um clima de estranheza e de isolamento, muito positivo ao propósito da produção: a solidão daquelas crianças em uma casa enorme e escura. Trata-se, portanto, de uma reflexão sobre infâncias roubadas por pais ausentes. Nem mesmo o conforto dos estofados, o carpete mácio ou os vários brinquedos espalhados pelo chão podem amenizar o abandono parental.
“Skinamarink: Canção de Ninar” está disponível nos cinemas.
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