O cinema colhe na vida real sua matéria prima para contar histórias fantásticas. Tão impressionantes que se o “baseado em fatos reais” não aparece no inicio da projeção, a inventividade dos roteiristas que imaginaram aquilo seria louvada. Uma dessas é a da esquiadora aposentada e organizadora de jogos clandestinos de Pôquer Molly Bloom, no filme vivida por Jessica Chastain. Molly e seus irmãos são treinados desde pequenos pelo rígido pai Larry Bloom (Kevin Costner) para serem vencedores. Ele não admite o fracasso da filha, que sofre um acidente e abandona as olimpíadas onde era uma das favoritas a conquistar medalhas. Após largar o esporte e sem saber o que fazer, a mulher entra no mundo dos apostadores de Pôquer, que contém celebridades de todas as áreas prontas para gastar milhões em uma única noite. Claro que tudo sai do controle e ela acaba envolvida com a máfia Russa e passa a ser investigada e processada pelo governo americano.
“A Grande Jogada” conta toda a jornada por meio de flashbacks intercalados com o presente onde o julgamento está às vésperas de acontecer. Dirigido e roteirizado por Aaron Sorkin o longa não economiza nos rápidos e abundantes diálogos. Quem o conhece de “A Rede Social” sabe que a verborragia é sua marca registrada. Aqui, além dos diálogos, ainda há a narração em Off da personagem principal. Então, fica difícil acompanhar a legenda para quem não sabe inglês. Todo esse falatório incomoda nas duas horas e vinte de duração e, talvez, nas mãos de um cineasta mais sensível cinematograficamente, a gramática das palavras poderia ser substituída pela gramática das câmeras. Melhor do que falar é mostrar, na linguagem do cinema. O filme se torna uma espécie de teatro falado em suas inúmeras sequências em cenários que não possuem nenhuma inspiração estética. Quando a ação vai para a rua é de uma forma engessada em planos estáticos e fotografia sem vida. Desenvolvimentos significativos no que diz respeito à direção são inexistentes, o que torna o banal preponderante.Já que é o texto que recebe a maior atenção, nada mais natural que escalar uma protagonista como Chastain. Sua poderosa presença e bela construção de personagem são de emocionar. Para esse papel não bastava uma atriz conhecida, mas sim um ícone mundial. Só assim para que a conexão com o público fosse feita em meio a uma escolha narrativa tão limitada. Isso também se aplica ao advogado sensível de Idris Elba. O roteiro não é primoroso e possui alguns atos falhos: a presença inesperada do pai em certo momento é quase um “Deus Ex machina” e o senso de moral e justiça de personagens importantes ficam inverossímeis mesmo sabendo que é tudo baseado em fatos. Os jogadores inveterados de Michael Cera, Chris O’Dowd e Bill Camp são importantes para que Chastain seja o brilho máximo em cena. Suas neuroses e superstições a levarão do céu ao inferno.
A falta de visão de seus realizadores poda “A Grande Jogada”, tirando sua relevância. Temas como ambição, busca pelo sucesso e família são desperdiçados em um microcosmo que é preso pelas lentes pouco inventivas. Era preciso fazer cinema e deixar o livro que foi usado como base para o roteiro de lado, impossibilitando que a literatura interferisse de forma bruta nas imagens. O texto é fantástico, o que faltou foi usá-lo com parcimônia. Sobra uma personagem feminina forte que luta em um mundo dominado pelos homens para poder sobreviver. Sua luta é bem representada por uma interprete fantástica, que faz sua própria imagem ligar-se a da personagem, e isso não é pouco em um mundo que cada vez mais pede o empoderamento feminino.
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