O filme “Roter Himmel” (“Afire”), dirigido pelo cineasta alemão Christian Petzold, conquistou o Urso de Prata no Festival de Berlim deste ano provavelmente porque cativou o júri com sua narrativa poderosa, desprovida de artifícios supérfluos, e competentes atuações de seu reduzido elenco, notadamente a de Paula Beer, que dá vida a uma personagem encantadora, porém enigmática. Sua interpretação de Nadja, hospedada na casa de praia do estudante de arte Felix (Langston Uibel), que viaja ao local na companhia de seu amigo Leon (Thomas Schubert) para que este conclua tranquilamente seu segundo livro, é notável.
Entretanto, o ambiente que prometia dias serenos é transformado pela chegada de Nadja e de um de seus amantes, o que resulta em intensas turbulências nas vidas dos amigos, deixando-os com os sentimentos à flor da pele.
No entanto, o mais afetado pela “intrusão” dos visitantes inesperados é Leon, visto que ele anseia pela solidão a fim de dedicar atenção integral ao seu manuscrito. O único dilema é que sua nova obra versa sobre relacionamentos humanos, e ele evita cuidadosamente vínculos afetivos com qualquer pessoa que se aproxime dele. Assim, o roteiro concebido por Petzold indaga se é viável criar uma obra de arte desvinculada das experiências humanas de seu criador. Seria possível para Leon se distanciar do mundo e ainda assim escrever um livro que depende de suas vivências amorosas e fraternais? Ao que parece, não, pois sua história é qualificada por seu editor (Matthias Brandt) e por Nadja como totalmente incoerente e destituída de alma.
Diante do suposto fracasso de sua empreitada e devido a suas dificuldades de comunicação, Leon se sente acuado, especialmente depois que seu amigo Felix inicia um envolvimento amoroso com o amante de Nadja. Neste “ambiente hostil”, o jovem recorre ao sarcasmo e à ironia como meios de autodefesa, além de se afastar progressivamente do grupo. O distanciamento físico entre ele e os demais é habilmente retratado pela mise-en-scène, que frequentemente o posiciona à margem ou em oposição através de enquadramentos que o isolam na tela, antes de posteriormente apresentar seus companheiros em harmonia. Mesmo quando ele compartilha o mesmo espaço com Nadja ou Felix, persiste um clima de desconforto e poucos gestos de proximidade. Contudo, a situação muda drasticamente quando um imenso incêndio florestal ameaça destruir a casa e a vida de seus moradores.
O fogo, nesse contexto, não apenas simboliza a devastação, mas também se torna a metáfora da paixão, do amor e da reconstrução. As chamas que devoram a floresta e ceifam vidas acabam por forçar o protagonista a sair de sua concha e a expressar seus sentimentos e emoções. O céu é tingido pelo vermelho dos incêndios, que também se apossam alegoricamente de Leon. A partir desse momento, ele traçará um novo percurso, repleto de perdas, descobertas e revelações. Portanto, Christian Petzold consegue narrar, de forma simples, sua história repleta de drama, com um toque de romance e profundos insights sobre a condição humana.
Este Filme foi visto durante a 47ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.
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