A criação artística pode ter início quando o artista externaliza uma memória sentimental que o marcou. No cinema, mesmo quando um diretor ou roteirista trabalham com materiais encomendado por terceiros, tentam colocar uma pitada dessas memórias em algum personagem ou cena. Porém, para que roteiros desse tipo deem certo, precisam possuir um elo com o espectador, que é o que se propõe em ficar quase duas horas em uma sala escura vendo algo que se passou na vida de outra pessoa.
É esse elo que falta em “Minha Lua de Mel polonesa”, de Elise Otzenberger. Para Otzenberger, a trama que segue o casal francês Anna (Judith Chemla) e Adam (Arthur Igual) em uma viagem para a Polônia – que serve como lua de mel e também para a descoberta de suas origens – tem um valor extremamente sentimental, já que é uma homenagem a sua avó judia polonesa que emigrou para a França depois da Segunda Guerra Mundial. O problema é que a diretora não compartilha a figura de sua avó com o espectador.
Em nenhum momento é mostrada uma representação dessa avó tão amada, por isso é preciso se contentar com apenas um punhado de fotos antigas que passam pela tela ainda no início do filme. Sem uma referência de carne e osso não há uma ligação afetiva com o sofrimento de uma judia que viveu em um dos piores lugares da Europa durante a guerra. Um flashback resolveria esse problema, no entanto, por ser um filme independente, provavelmente não possuía os recursos para filmar em sets de época.
Anna se desespera quando percebe que as memórias de sua avó estão desaparecendo, entretanto, seu desespero é confundido com a neurose cômica presentes na construção da personagem. Ela passa de encantadora a irritante no intervalo de alguns cortes, com a ajuda dos olhos azuis sempre atentos em de um rosto de beleza exótica da intérprete. Chorando e gritando, Anna parece sofrer, mas sem comover quem assiste, afinal, quais sentimentos ela tenta guardar para não esquecer? Eles não foram apresentados. Em síntese, em “Minha Lua de Mel polonesa” pretende falar sobre memórias perdidas e sobre um passado soterrado por uma modernidade destrutiva. Isso fica evidente nas andanças do casal em lua de mel em uma Polônia contemporânea que ignora os judeus mortos e os que ainda sobrevivem no presente. Um cemitério judaico às ruínas é a comprovação material do descaso. Ninguém mais se importa com os massacres acontecidos naquelas terras e os locais de barbáries, atualmente são pontos turísticos.
Se esse esquecimento tivesse sido mais bem trabalhado pelo roteiro, talvez causassem um interesse maior, já que tocariam em questões políticas de uma Polônia que, no século 21, parece querer emular o que foi feito pela Alemanha no século 20. O movimento de um governo extremista xenófobo tomou conta de um país que pretende fazer sofrer tanto quanto sofreu nas mãos dos nazistas. Mas todas essas questões ficam na superfície, enquanto fantasmas são perseguidos em um road movie que serviria mais como aqueles típicos filmes de família feitos em Super 8.
Vídeo: Divulgação/Pandora Filmes
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