Quando começamos a ter desejos, sonhos e vontades? Nossos sonhos são inerentes a nós? E quando começamos a entender a nossa realidade, o que nos cerca? Uma coisa é certa, sabemos que os sonhos vêm primeiro, e que quando entendemos o nosso lugar no mundo, entendemos que nossos sonhos podem não se tornar realidade.
Nas primeiras cenas do filme “Softie”, após uma mudança conturbada, vemos o jovem Johnny na sala de aula em seu primeiro dia na nova escola. Seu professor pergunta a todos os alunos, “O que vocês querem ser quando crescer?” E Johnny é o único a não saber a resposta. A partir desse ponto, entramos na pele do personagem e vemos seus desejos se aflorarem. Mas algo está errado… Johnny teve que crescer, se tornar adulto muito prematuramente aos 10 anos. Ele cuida de sua pequena irmã e da sua mãe alcoólatra. Sua família disfuncional e sua situação financeira o tiraram a infância. Johnny não só cresceu, ele desenvolveu uma visão da realidade extremamente deturpada. Original e sutil, o filme é avassalador.
Aliocha Reinert entrega uma das mais potentes interpretações mirins do cinema atual.
O longa é extremamente comprometido em fazer com que você acompanhe toda a história a partir do ponto de vista desse garoto e entenda a sua realidade, os seus sonhos, e principalmente seus desejos. Johnny ao longo da obra desenvolve uma paixão por seu professor que se manifesta de modo totalmente prejudicial a ele, se tornando uma obsessão. O terceiro ato da narrativa é devastador, mostrando as consequências de exposição precoce a vida adulta. Diante desse cenário, os diálogos são extremamente afiados, mesmo que interpretados pelas crianças do filme, inclusive pela irmã mais nova de Johnny.
Aliocha Reinert, que interpreta Johnny, é uma escolha acertada para o papel. O ator é extremamente talentoso e entrega uma performance sensível e realista. Em conjunto com o resto do elenco, a obra nos proporciona pequenas cenas para além da linha narrativa, seja atrapalhando o irmão e a namorada a fazerem sexo ou brincando com sua irmã mais nova enquanto passeia com o cachorro. O filme é recheado dessas pequenas interações do cotidiano da família, o que estrutura muito bem a nossa compreensão de algumas atitudes do personagem.
Mas as cenas entre o Johnny e seu professor, Sr. Adamski, interpretado Antoine Reinartz, são geniais. Através de ações e pequenos gestos do garoto, podemos observar a sua paixão aflorando, e a relação confusa que ele desenvolve internamente com essa figura, por vezes paterna, que o apoia e dá a ele um objetivo: ser alguém. Samuel Theis, diretor do filme, se atenta as miudezas do desenvolvimento do jovem, e explora com primor a mente do seu personagem.
Criativo em sua narrativa, e criativo em sua fotografia
Acompanhando toda essa complexa estrutura narrativa, temos uma fotografia que potencializa os sentimentos de Johnny, com paletas de cores frias, e enquadramentos que utilizam de forma inteligente os cenários e os posicionamentos dos personagens. Em determinada cena, o filme faz uso das luzes dos carros, deixando-as fora de foco, e coloca Johnny entre elas, dando ao público a sensação de um sonho febril. O longa-metragem é recheado de momentos criativos, com usos inteligentes de trilha diegética e até dos celulares dos personagens para compor as cenas.
Quer estar por dentro do que acontece no mundo do entretenimento? Então, faça parte do nosso CANAL OFICIAL DO WHATSAPP e receba novidades todos os dias.