Foi exibido na 48ª Mostra de Cinema Internacional de São Paulo o documentário “Ocupa SP” dirigido por Gustavo Ribeiro, que é uma ode à diversidade de quatro comunidades retratadas, trazendo um convite interessantíssimo para sentirmos e tentarmos entender essa megalópole que é a maior cidade da América Latina e 5ª do mundo em termos de espaço e moradia.
O filme nos conduz pelas dificuldades e resistência nos assentamentos levantados e no pertencimento de pessoas que fazem parte da cidade e que como qualquer pessoa tem direito a ter um lugar de paz, tranquilidade e lazer, mas não é sempre o que acontece em São Paulo.
O diretor e a roteirista Juliana Borges nos mostram que o que a cidade de tem de enorme e populosa, tem de desigualdade, desorganização e lugares que poderiam se tornar moradia de milhões, promovendo o mínimo de dignidade como nos garante a própria Constituição Federal, mas por falta de interesse e políticas sustentáveis, insiste em permanecer opressora.
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As histórias filmadas são de luta, resistência (ênfase nessa palavra), disputas desiguais envolvendo a falta de políticas públicas adequadas, depoimentos de urbanistas, estudiosos, arquitetos, artistas, pessoas eméritas da cidade de São Paulo como o Padre Júlio Lancelloti, pároco e figura presente em diversos movimentos de solidariedade e o escritor Ignácio de Loyola Brandão (Imortal da Academia Brasileira de Letras) capturados pelas lentes discretas e respeitosas de Gustavo Ribeiro, que constatam o quanto a falta de consciência social impacta nos moradores muitas vezes frágeis diante do tamanho dos desafios para tornar um colosso, uma selva de pedra como essa cidade, tão calorosa na sua grandeza, tão rica de recursos financeiros em um lugar tão desigual em termos de direitos.
Seja em uma comunidade levantada do chão, com importantes imagens de arquivo do antes e depois da transformação de um assentamento em um bairro com luz, sistema de esgoto e lazer, intercalados pelos depoimentos dos moradores emblemáticos responsáveis pela sua construção, passando por um coletivo que cultiva e fornece verduras e legumes saudáveis para creches, escolas e pessoas em situação de insegurança alimentar, a primeira metade do filme encerra de forma esperançosa essas histórias que geram orgulhos nos entrevistados e se constitui em uma vitória do sentido ligado ao próprio título escolhido pelo filme e com uma trilha sonora intrigante e urbana, como não poderia deixar de ser.
A próxima história trata de um grupo de teatro montado bem próximo do que chamamos de Cracolândia, onde as performances são escritas e encenadas baseadas em histórias acerca vizinhança, das pessoas que sofrem pelos problemas das drogas e a invisibilidade com que são tratados.
É bem interessante a pessoalidade com que Gustavo, o diretor do filme, incorpora nas falas dos entrevistados ao mesmo tempo em que expande sua lente para retratar a plateia de pessoas compenetradas no espetáculo, montado pelo teatro sob pilhas, containers, e janelas de vidro que permitem a visão de quem está de fora e convida para entrar, assim como a cinematografia que neste momento, diferente dos segmentos anteriores, traz movimento, respeitando o novo segmento do documentário.
E chegamos à quarta história e a mais bela cinematografia, que imagino não poderia ser diferente, pois trata da narrativa calcada em uma tribo indígena que reside no pico do Jaraguá e se até o momento mencionava-se o direito à ancestralidade, nada mais justo de permitir aos membros da tribo que se manifestem através de suas cerimônias e rituais sagrados, fazendo suas vozes ecoarem no que são os primeiros habitantes da cidade que como sabemos, foram sendo empurrados cada vez mais para lugares ermos e distantes na prova de que o desrespeito e genocídio contra os indígenas realmente acontece no mundo inteiro.
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Infelizmente um documentário mesmo que tão bem realizado como esse não consegue alcançar a completude e todos os contrastes de uma megalópole como São Paulo, mas ajuda a iluminar caminhos através de uma visão empática para uma melhor convivência, registrando histórias de gente brava, aguerrida, de todas as cores e formas mas invisíveis porque afinal, mesmo contendo uma grandeza e identidade própria, mesmo com seus problemas estruturais da falta de moradia e abandono retratada neste filme, ainda trata-se do lugar mais plural e cheio de possibilidades da América Latina.
Imagem Destacada: Divulgação/”NÓS”
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