Em “Pequenas Coisas como Estas”, o agora oscarizado Cillian Murphy retorna à sua Irlanda natal para contar a história, baseada em fatos, de um condado dominado por um convento de freiras, a maior provedora financeira da região, que, de maneira insidiosa, sequestra garotas órfãs e as mantém em condições de servidão, além de apreender os bebês das que estão grávidas. O filme se passa em 1985 e é um recorte de uma das muitas atrocidades perpetradas pela Igreja Católica ao longo da história.
O longa de Tim Mielants busca, portanto, registrar nas telas dos cinemas eventos que poderiam facilmente ser relegados ao esquecimento, mas o faz de forma um tanto maniqueísta ao transformar o convento em uma dessas casas de terror repletas de sombras e gritos ecoando de cômodos ocultos. As freiras, por sua vez, são apresentadas como seres desprovidos de alma, que agem movidas por pura maldade. Embora essa maldade tenha realmente existido, seria pertinente também ilustrar o poder que se exercia sobre elas, provavelmente operando em esferas distantes do modesto condado, e, assim, tentar analisar as motivações subjacentes a tais atos.
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Se, em parte, o roteiro de Enda Walsh peca ao tentar manipular o espectador para conduzi-lo a uma análise unidimensional da religião católica, ele é, na maior parte do tempo, preciso na construção do protagonista com a ajuda de Murphy em sua precisa construção de um homem reservado e que profere poucas palavras, mesmo vivendo em uma casa sempre cheia e alegremente barulhenta, composta por suas filhas e esposa. É evidente que há algo em seu passado relacionado à igreja que o atormenta, e isso se intensifica quando ele testemunha uma das garotas, toda machucada, tentando escapar do convento. Quando afirmo que o texto é preciso apenas na maior parte do tempo é porque esse trauma com a igreja não se torna claro nos flashbacks que ilustram sua infância. Existe um elemento que envolve sua mãe, que também pode ter sido uma vítima das freiras, mas isso é uma dedução de minha parte, já que tal definição não está explícita no filme.
Portanto, “Pequenas Coisas como Estas” é um filme irregular, mas portador de uma corajosa mensagem anticatólica, que pode desagradar a muitos devido à forma como essa religião é representada. No entanto, aqueles que se sentirem ofendidos podem consultar registros históricos para descobrir que, além das atrocidades apresentadas na obra, há inúmeras outras que permanecem desconhecidas pelo grande público. Assim, ficará evidente que o problema é real e ainda mais abrangente, e que muito ainda precisa ser revelado para que, talvez um dia, a justiça seja feita.
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Filme assistido na 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo
Imagem em destaque: Divulgação/Lionsgate Movies
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