“Canções Para Depois do Ódio” é o primeiro disco solo de Marcelo Yuka. Marcelo é ex-baterista da banda “O Rappa” e também compôs algumas das letras mais atemporais da banda, como “Pescador de Ilusões” e “Minha Alma (A Paz Que Eu Não Quero)”. Sempre compôs letras atravessadas com responsabilidade sócio-política o que acabou se tornando uma das identidades de O Rappa.
Em CPDDO, Yuka revela uma outra visão sobre o panorama: a esperança de haver uma luz no fim desse túnel turbulento que é viver na sociedade contemporânea. Quase todas as 16 canções do álbum são interpretadas por Bukassa Kabengele. Bukassa é ator e cantor, nasceu na Bélgica e morou no Congo. Veio para o Brasil aproximadamente com 10 anos.
“O Dia em Que o Homem Cansa” é a faixa introdutória cantada por Bárbara Mendes e Bukassa. Apresenta de maneira fidedigna toda proposta do CD. Tem uma melancolia atravessada nos sintetizadores que integram a melodia. Apresenta um movimento, oposto ao usual. “Insinuei não dizer que não quero ganhar sem você(…)” vai de encontro à ideologia da vida ser uma competição, que se compete e se ganha sozinho. O desague, o peito aberto e o melhor disparo “não quero ganhar sem você”.
“Assim é a Água”, segunda faixa do álbum é toda cantada por Kabengele. E nos coloca a reflexão da nossa responsabilidade ante tudo aquilo que nos cerca e que nos é dado. “Assim é a água (do jeito que você interage com ela, ela te da vida ou mágoa(…)” diz o refrão. As coisas tem o valor e a magnitude que nós atribuímos a coisa.
Em “Movimento da Massa”, Yuka nos convida a observar o que há de belo e poético quando uma grande quantidade de pessoas se reúnem por um objetivo comum. Ás vezes em um estádio de futebol vendo seu time vencer, ás vezes em uma manifestação pra tentar fazer o país crescer.
“Por Pouco” é a quarta faixa do álbum e é interpretado pela cantora “Céu”. A letra faz um registro de uma visão cinzenta de vida que, por pouco, faria o autor dispensar coisas belas e simples, como a luz do dia. “Myto” explora e “inocente” ignorância das pessoas ao pensarem que podem ver tudo com uma única ferramenta: os olhos. Desafia também a atitude, um tanto prepotente, que muito se reproduz na sociedade. Os homens sempre achando que terão as respostas para tudo. “O mito do homem repousa em seu próprio absurdo(…)”.
“Agora Nesse Momento”, o Marcelo joga novamente uma visão internalizada. Elucida o quanto é importante haver “barulho” dentro de nós. Barulho esse, dado o contexto, seriam nossos pensamentos, reflexões e movimentos de dentro pra fora que promovam algo de positivo e mais avançado. Uma busca por uma versão melhor de nós mesmos.
“Confusão” é mais uma composição brilhante de Yuka. Quantas confusões estão sendo promovidas no cenário inflamado da cultura ocidental, em que padrões normativos estão em plena desconstrução, demandando sapiência que muitas vezes ainda falta nos humanos o povo confunde justiça com vingança/o idiota confunde poder com arrogância/ a dança confunde o corpo com o som/ o artista confunde sucesso com o dom.
“Até Você”, “Dali”, “A Carga” e “Um Minuto Antes do Fim” abordam questões bem concretas e insistentes em nosso atual contexto. O policial que abusa, um governo que abusa e a decadência da “humanidade” que deveria haver nos homens. Algo que reflete de maneira brusca o contexto sócio-econômico contribuindo para a injusta divisão. São apresentadas com batidas densas, que evocam uma certa urgência no que está sendo dito e nos remetem ao batuque dos terreiros.
“Memórias Artesanais” e “A Tempestade” são cantadas a partir de experiências pessoais e intransferíveis. Fatos do dia-a-dia e memórias que valem mais que ouro, e que também é simples.
“Cortejo Milenar” exalta a cultura brasileira. Trás o samba, o funk, folclore e carnaval. É cantada por Seu Jorge junto à Bukassa, mantendo a mesma linha de melodias porém apresentando um toque brasileiro carnavalesco bem ao fundo. Cortejo Milenar é o sorriso do povo e a alegria sublime da vida.
“Cidade do Amparo” e “Algo Mais Explícito” desaguam, com água muito fria, os crimes e violações sociais que acometem grande parte da população. Como as decisões dos que se portam como senhores feudais violam os direitos das pessoas.
Marcelo Yuka nos presenteou com um álbum repleto de poesias sóbrias sobre a sociedade com uma pitada de esperança. Enquanto músico e político, criou uma obra que contrapõe o que faz sucesso atualmente, fazendo uma chamada de urgência para questões que precisamos refletir mais. Canções para deixar o ódio pra trás.
Por Letycia Miranda
Quer estar por dentro do que acontece no mundo do entretenimento? Então, faça parte do nosso CANAL OFICIAL DO WHATSAPP e receba novidades todos os dias.