Por favor, queimem a fita
Hollywood precisa se reinventar! Parar de insistir em fórmulas batidas e clichês e abrir mais espaço para ideias originais. Existe um mundo de possibilidades lá fora, querendo uma oportunidade e, às vezes, esse acaba não conseguindo entrar na famosa meca do cinema. Enquanto isso continuar acontecendo, veremos a mesma enxurrada de remakes desnecessários, ou mal realizados, invadindo o mercado em busca de bilheterias de sucesso. Mesmo não sendo todos os projetos capazes de conseguir essa façanha os estúdios continuam insistindo, atirando sem mirar o alvo, na tentativa de acertar em cheio. Todavia, chega um momento no qual estamos cansados de vermos o mais do mesmo, como, por exemplo, “O Chamado 3”, produto mais novo a surgir dessa safra.
O filme foi anunciado como uma nova proposta, ganhando um trailer espetacular e bastante convidativo, além de um nome que fugia da consolidada mesmice de “1, 2, 3″. Parecia que veríamos uma reinvenção completa da história, mesmo sabendo que tratava-se de uma continuação dos sucessos americanos “O Chamado”, adaptado em 2002 a partir do ótimo “Ringu”, e “O Chamado 2” de 2005. Todavia, quando percebemos que a campanha do filme foi mudada antes da estreia do mesmo aqui no Brasil, perdendo o bom título “Chamados” para entrada do convencional “O Chamado 3”, começamos a enxergar a franquia com o mesmo olhar voltado para vários outros projeto do tipo (é bom lembrar que em muitos países o filme se lançou como “Rings”). E essa atitude precipitada não nos levou a outro lugar, o que encontramos foi a mesma história “surrada” com outros atores, e uma tentativa mal trabalhada de inserir uma vertente que poderia ser realmente um gás diferenciado nas mãos de outro roteirista e diretor.
O enredo do filme, diferente do que o trailer revela, não aporta com uma entrada direta na tecnologia, o que poderia ser muito interessante se bem desenvolvido. A premissa é a mesma dos dois primeiros filmes e traz a velha e empoeira fita VHS gravada com imagens bizarras. Dessa vez, temos a apaixonada Júlia tentando salvar o namorado da perdição, após ele ter assistido o vídeo. Contudo, no meio da trama, ela acaba descobrindo que toda a história vai além do que ela pensava.
A produção, que envolve nomes como Chris Bender, Mike Macari e Ehren Kruger, acostumados com projetos com um foco mais adolescente, tenta direcionar a história para um ritmo mais jovial, com muito desespero e gritaria, mas acaba perdendo o cunho psicológico que poderia ser aproveitado pelo roteiro, valorizando bastante todo conteúdo. Embora seja bem produzido em muitos aspectos, trazendo efeitos superiores aos primeiros por exemplo (graças ao avanço da tecnologia), o filme acaba sendo uma avalanche de sequências duvidosas.
O roteiro, escrito a três mãos, traz o experiente Akiva Goldsman (“O Cliente”, “Uma mente brilhante”) em parceria com Jacob Estes, responsável por “Mean Creek”, e David Loucka, roteirista do bom “A última casa da rua”. Contudo, o trio não foi feliz em desenvolver um conteúdo original. Ao invés disso, o que nos é apresentado falha fortemente em segurar todos os atos da narrativa. Muito mal estruturada a história começa bem, mas do meio para o fim é só ladeira abaixo. A construção oferecida as personagens é fraca, principalmente a do deficiente visual “Burke” e o professor “Gabriel”, e alguns diálogos poderiam também ser evitados.
Com pouca experiência na direção, F. Javier Gutiérrez não consegue segurar a pressão e nos apresenta uma idealização frágil e sem nenhuma sustenção. Como o roteiro, somente no primeiro ato do filme o diretor conquista um leque de ideias mais amplas, com enquadramentos funcionais e impactantes. Depois disso, toda ideologia que estava sendo arquitetada desaparece e passamos a assistir um filme casual de terror/suspense que se apoia completamente em um som e trilha sonora exagerados para assustar o espectador.
A Fotografia de Sharone Meir (“Wiplash”) é uma das melhores partes do filme. A atmosfera criada por Meir proporciona mais claustrofobia e “terror” do que todo o conjunto da obra. Com uma paleta de cores que mistura o verde, o cinza e o preto encontramos certa obscuridade em quase todos os ambientes, mas o fotógrafo quebra com sensatez esse caminho quando revela os momentos de felicidade do casal principal, apresentado cores mais quentes que revelam a total vivacidade do lugar. O Figurino de Christopher Peterson, experiente assistente de figurino de produções de sucesso como “O Lobo de Wall Street” e “Carol”, também segue a mesma direção da fotografia e acerta em cheio em algo mais despojado, sóbrio. Já a direção de arte de Naaman Marshall, que foi responsável pelos últimos dois filmes do “Batman” da trilogia de Christopher Nolan, faz diferença ao nos proporcionar um serviço muito bem realizado, capaz de dialogar e ajudar bastante no desenvolvimento de toda fotografia do filme.
Entre todos do elenco, o melhor desempenho é da italiana Matilda Anna Ingrid Lutz, que começou a dar as caras recentemente em Hollywood e no filme vive Julia. Sua atuação está acima do próprio roteiro e ela consegue superar os direcionamentos dados a sua personagem. Algo que não encontramos no ator Alex Roe, que interpreta Holt e nos oferece uma atuação forçada e desinteressante. O ótimo Johnny Galecki também não se encontrou no papel de Gabriel, bem como Vincent D’Onofrio na pele de Burke. Ambos estão perdidos em suas cenas, realizando interpretações caricatas marcadas por excessivos gestos psicológicos.
Por fim, “O Chamado 3” pode até divertir quem não conhece muito bem a franquia ao oferecer a possibilidade de assisti-lo sem ter acompanhado os dois primeiros filmes. Todavia, não passa de um filme comum de terror, sem nenhuma inovação. Só esperamos que a continuação seja melhor desenvolvida, do contrário a solução é queimar de vez a fita.
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