A bela e o bobo
Depois que seus grandes olhos encantaram plateias em “Amélie Poulan”, Audrey Tautou tornou-se um bom motivo para escolher ver um filme. Ela não desaponta: em “A delicadeza do amor”, seu ar doce e aparentemente frágil pode nos conquistar, mas sua sinceridade em cenas de maior intensidade dramática provam sua força como atriz.
Nathalie vive um casamento feliz e romântico com um homem lindo, François (Pio Marmai), e até suas famílias parecem perfeitas, sem discussões ou comportamentos que fizessem o casal querer mantê-las à distância. Mas como nem tudo são flores, um dia seu marido sofre um acidente fatal. A partir daí, Nathalie se refugia no trabalho, até que três anos mais tarde, numa atitude impulsiva da qual diz não se lembrar depois, beija Markus (François Damiens), um colega de trabalho. Basta isso para que ele se apaixone, mas o caminho para conquistá-la de verdade não se mostra muito fácil.
Markus é sueco e seu jeito, suas roupas, sua aparência, enfim, parecem ser motivo de chacota ou desprezo por onde passa – isso quando simplesmente sua existência nem mesmo é notada. François Damiens representa com perfeição o sujeito considerado esquisito pelos demais. O figurino exerce um papel fundamental aqui; no entanto, é curioso constatar que não há nada de bizarro no modo de vestir de Markus, os outros é que o discriminam por suas roupas e o olham como se fosse inferior. Talvez ele seja um sueco excessivamente deselegante para o gosto francês. Bruno Todeschini é Charles, o chefe impertinente que assedia Nathalie desde o primeiro momento e, mesmo com seu ar e comportamento canalha, parece estar realmente apaixonado por ela. Ainda assim, não conquista nossa simpatia. Já de início, percebemos o bom trabalho do ator e sentimos uma certa repulsa pelo personagem.
E por falar em figurino, a secretária do chefe (Ingrid, representada por Audrey Fleurot) aparece pouco no filme mas é impossível não notá-la, por sua postura e roupas que lembram muito Jessica Rabbit, personagem do desenho animado “Uma cilada para Roger Rabbit” (1988).“A delicadeza do amor” é um filme em cores vivas e com movimentos de câmera interessantes, como por exemplo, quando esta segue o caminhar de Nathalie pela rua ou gira em 360 graus para representar o casamento com François de forma não realista. Outro momento não realista usado para mostrar a empolgação e a súbita ascensão da autoestima de Markus após o beijo inesperado também é bem divertido. A trilha – com canções originais – ficou a cargo de Emilie Simon, uma cantora e compositora muito popular na França, mas há músicas adicionais como a animada “Get in on”, da banda inglesa T Rex, famosa nos anos setenta.
Chamam a atenção detalhes cenográficos, como o poster de John e Yoko no quarto de Nathalie e François – há curiosamente uma menção à Yoko mais tarde – e o cartaz de um filme de Bergman no escritório de Charles, que confessa mantê-lo ali para agradar aos acionistas (a empresa é sueca). Dirigido pelos irmãos David e Stéphane Foenkinos, com roteiro de David baseado em seu próprio livro, o filme apresenta transições de tempo interessantes e bons diálogos – é através das falas de Markus, por exemplo, que ele mostra o senso de humor que certamente conta pontos nas suas tentativas de conquistar Nathalie. É um filme doce sem ser enjoativo ou tolo. Leve e delicado, como sugere o título.
Neuza Rodrigues
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