“Se você tirar uma cobra do Japão e trouxer ela pra cá, ela nunca vai deixar de ser cobra”
“Antes o Tempo não Acabava” é um longa-metragem de direção de Sergio Andrade e Fábio Baldo, o segundo que traz a mesma temática dirigido por Andrade. O filme retrata a vida de um jovem indígena, Anderson, estrelado pelo também nativo Anderson Tikuna, que vive um conflito cultural entre as tradições indígenas e a vida urbana, tendo vivido sua infância em uma tribo indígena e agora a juventude em uma cidade grande e capitalista.
Tendo como cenário de fundo a cidade de Manaus e uma aldeia na fronteira colombiana, a produção mostra com delicadeza e ao mesmo tempo de forma chocante a dicotomia e confronto que sempre houve e está cada vez mais crescente entre a cultura indígena e urbana, sendo essa última quase que forçada a entrar e fazer parte da vida dos nativos de nossa terra.
Com uma fotografia impecável da floresta Amazônica, consegue retratar muito bem a vida periférica das comunidades locais, sua rotina urbana envolvendo o trabalho nas grandes indústrias e a pobreza não só material, mas também a precariedade na qualidade de vida neste local tão pouco reconhecido pelo Brasil afora. Assim também como dá destaque para a cultura em questão e seus artesanatos, costumes e língua nativa, evidenciando a forma como são pouco valorizados e muito explorados pelos que não vivenciam seus hábitos culturais.
O roteiro, um tanto quanto confuso, tenta trazer uma reflexão sobre este antagonismo cultural, colocando questões polêmicas como a os rituais de inserção dos homens nativos na sociedade, a sexualidade vivida por eles e até mesmo a forma de lidarem com as doenças.
Três são as questões que existem sim, em qualquer sociedade, porém, pouco ou talvez mal explorados e apresentados no filme, já que, um leigo, que não compreende e conhece a fundo a cultura nativa, pode encarar de forma preconceituosa estes argumentos ao assistir o filme. O que pode ser visto como algo bom ou ruim: bom, se levar o espectador a uma pesquisa e estudo a fundo sobre o tema, mas ruim, se esse mesmo ficar só na superficialidade e tirar conclusões precipitadas e errôneas somente ao assistir o longa.
A homossexualidade retratada no filme, se mal interpretada, leva a crer que as tribos indígenas são preconceituosas e impõe seus ritos de forma obrigatória a seus membros; a doença da sobrinha de Anderson, também se vista de forma rasa mostra uma tribo desinformada e eugênica; assim como os rituais, que para quem não os conhece, podem ser interpretados como antiquados, desnecessários e torturantes.
São pontos que poderiam ser melhores trabalhados e explorados, dando uma outra visão, afinal de contas, toda cultura tem seu sentido e objetivo de ser, e claro, sendo diferente das outras, até mesmo de forma incompreensíveis, não cabendo espaço para comparações. Daí mesmo, o conflito encontrado pelo jovem Anderson, que se vê em meio a dois ambientes culturais diferentes e se põe a questionar e comparar ambos.
A reflexão que traz é grandiosa se encarada a fundo, afinal de contas, é este choque que uma pessoa vive se não está inserida por completo na sua individualidade, podendo ser adaptada não só para a questão indígena, mas também para outras realidades, como portadores de doenças genéticas, deformidades físicas, e culturas diversas. Pessoas que, se não bem esclarecidas quanto à sua individualidade, acabam por viverem conflitos durante toda a sua vida, sem terem uma personalidade definida de quem realmente são, como no caso, o personagem principal, que não se enxerga nem como parte da cultura indígena e nem como da urbana.
Apresentado na “40ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo” no ano passado, é um filme bom, pelo que tenta ser, mas fraco pelo pouco que apresenta, deixando várias lacunas para perspectivas imprecisas sobre o tema, salvando a boa interpretação dos atores Anderson Tikuna (Anderson), Begê Muniz (Beto) e Rita Carelli (Pia).
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