No Brasil atual a justiça está passando por uma crise de identidade. Ela vê sair de suas entranhas alguns dos mais sórdidos malfeitores. De dentro das instituições que seriam guardiãs das leis há uma fuga de ratos. Parte do povo não consegue acreditar que juízes e promotores, antes heróis nacionais por causa da Lava jato, estão envolvidos em falcatruas que visam o poder político, ou simplesmente dinheiro. A ingenuidade de achar que apenas os políticos e os criminosos habituais podem cometer atrocidades ficou no passado. Não em um passado muito distante, mas o de uns dois anos atrás, e é desse passado que vem “Foro Íntimo” de Ricardo Mehedff.
Mehedff, responsável pelo roteiro junto com Guilherme Lessa, constrói sua história de forma dicotômica, onde o bem e o mal são bem delineados pelo roteiro. Nela, um juiz (Gustavo Werneck) precisa se exilar em um fórum cercado de seguranças armados depois que passa a julgar os crimes cometidos por um senador corrupto. O juiz possui uma inabalável ética profissional e prefere ficar trancado no local do que abandonar a importante função, mesmo que sua vida corra perigo. Os únicos desvios identificados no homem são de cunho sexual, sua moral é inabalável. Descrito como uma produção de 2017, mas filmado bem antes disso, “Foro Íntimo” mostra um Brasil muito fácil de decifrar, o que já não é mais assim, infelizmente.
Apesar de parecer algo irreal aos olhos dos mais céticos, se trata de uma história baseada em acontecimentos reais. Contudo, a direção de Mehedff busca outros caminhos além do realismo e acerta em uma confecção narrativa que bota um pé no fantástico e no expressionismo. Com um clima opressor apoiado na razão de aspecto 4:3, o Juiz, personagem principal, fica praticamente encaixotado nos planos. Principalmente quando é enquadrado em contra-plongée e o teto parece esmagá-lo. O preto e branco da fotografia também é um aliado para enfatizar o clima lúgubre e pessimista.Com isso, o Fórum se torna uma grande masmorra, o que acaba por degradar a condição psicológica do Juiz, que passa a ter alucinações com formigas saindo da ventilação, da comida e das paredes. Clara referência a “Pi” de Darren Aronofsky, evidentemente. Porém, o que realmente importa é que o juiz representa todo um sistema judicial acuado diante de políticos corruptos e de todo o tipo de bandidos, pelo menos na realidade da época em que o longa foi filmado. Sua autonomia se torna refém de interesses escusos. Hoje, no entanto, é sabido que os bons e os maus se confundem em uma amalgama de intenções.
Por fim, “Foro Íntimo” é um bom filme, com boas intenções, que só peca pela ingenuidade e por não ter alguns minutos a mais que tornariam sua conclusão menos apressada. Outro problema é seu final abrupto que dá a impressão de obra inacabada. Claro que a intensão pode ser a de isenção, ou a falta de uma ideia de resolução do problema por parte dos roteiristas, entregando ao espectador a tarefa de refletir a respeito. Este artificio já funcionou muito bem em outras produções, aqui só deixou aquela vontade de ver um clímax.
Imagens e Vídeo: Divulgação/Embaúba Filmes
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