Sendo uma produção franco-brasileira, “La Parle” foi realizado na residência artística Les Ateliers du Cinéma – promovida pelo diretor, roteirista e realizador francês Claude Lelouch (de obras como “Um Homem, Uma Mulher” e uma versão moderna de “Os Miseráveis”, entre tantos outros títulos). O filme foi roteirizado, produzido, dirigido e principalmente interpretado pelos 4 protagonistas.

Nele, temos esse grupo de amigos que se reúne para férias na cidade de Beaune, na França, onde cada um tem sua particularidade: Gabriela, a brasileira, se comunica constantemente com sua família no Brasil e principalmente com sua avó, que está no princípio/indício de uma doença que ameaça as memórias que elas têm juntas. Essa situação lhe traz alguns momentos de tristeza e até melancolia.
Temos Fanny, que é a mais “combativa” do grupo, independente e de opiniões fortes. Ela está passando por uma situação de saúde que não depende dela, o que pode abalar toda a certeza que tem sobre algumas coisas.
Kevin é o artista sensível. Às voltas com a gravação e edição de seu novo filme, ele reluta em relaxar mesmo em lugares paradisíacos, para continuar registrando sua obra. Além dessa preocupação, há também uma questão, digamos, familiar que também o assombra.
Já Simon é o bon vivant, somente interessado no descanso e diversão típicos de quando se viaja com amigos.
Filmado com câmeras de iPhone, o filme todo em preto e branco se beneficia do clima intimista a cada declaração dos personagens/atores/diretores, onde é possível, apesar das diferenças de personalidades, uma certa homogeneidade na condução.
Com exceção de Simon, que é retratado principalmente como o ouvinte, o festeiro ou testemunha das conversas e eventos, todos os demais têm seus desenvolvimentos como personagens. Seus medos atuais, o que os incomoda, perturba, estão na tela.
Destaco os trabalhos sensíveis dos 4 atores, roteiristas e diretores, pois, no que imagino serem iniciantes, promoveram um trabalho muito agradável de ver e acompanhar, gerando interesse em suas jornadas e caminhos. Levando consigo em seus momentos a metáfora do vem e vai do mar, como pode acontecer com qualquer amizade, porque veja, todos temos nossas preocupações, como eles, inclusive Simon, que só quer ver todo mundo feliz e aproveitar a companhia dos amigos. Questões como saudade, saúde, amor e expectativas estão impressas nos personagens como as ondas que vêm e vão.
Filmar com o celular traz o que considero algumas “vantagens”, percebidas pela quantidade de pessoas que circulam e fazem parte da história, que não se passa em um ambiente fechado como poderia ser, e sim, nas praias e ruas de Beaune, entre surfistas, banhistas e artistas de rua. Com uma desenvoltura e liberdade que só quem filma com um celular poderia ter, pois hoje esse verdadeiro meio de comunicação passa praticamente despercebido entre as pessoas, e o ato de filmar nunca pareceu ser tão fluído, tão natural.

A considerar, senti falta realmente de um escopo que somente uma câmera cinematográfica poderia capturar, com mais detalhes, um certo esmero de Cinema, que a história desses amigos merecia, e principalmente o cenário de Beaune merecia.
Porém, uma boa história pode ser contada até por palavras, certo? Gabriela ressente-se da saudade de sua avó, e pelas conversas, continua tentando trazer à memória (ah, a memória) os tempos em que estava no Brasil.
Kevin torna-se cada vez mais resoluto em deixar um pouco de lado sua obsessão artística e resolver sua questão familiar, com um apoio que nunca tinha imaginado que faria falta para ele.
Fanny tem a resposta sobre sua aflição, com uma personagem que nos traz assertividade e serenidade em um momento que seria complicado para todos nós.
Já Simon… Bom, informar o destino dele seria dar spoiler sobre a jornada dos amigos, a qual ele acompanha.
De qualquer forma, quando acompanhamos o final do filme, assim como na vida, algumas questões se resolvem, outras ficam pendentes na esperança de que, como no balanço do mar, seja o tempo de trazer ondas boas, para que se possa surfar, nadar e aproveitar a companhia dos amigos em um dia de sol.
Por Roberto Rezende


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