O longa, baseado em fatos, “O Apedrejamento de Soraya M” é de 2009, mas suas denúncias continuam, infelizmente, muito atuais. Isso porque, em 2022, o Irã está envolto em protestos devido à morte de Mahsa Amini, que foi vítima de uma cruel policia de costumes. As leis medievais amparadas em uma leitura deturpada do alcorão matam cidadãos aos montes e há muito tempo no país do oriente médio, mas são as mulheres os seus alvos principais. Soraya M, assim como Mahsa, foi mais uma a perder a vida porque foi julgada por homens que decidiram que ela cometeu adultério, um crime bárbaro contra a religião e os costumes, de acordo com suas leis.
O roteiro escrito por Betsy Giffen Nowrasteh e Cyrus Nowrasteh (que também é o diretor) expõe toda a armação do marido de Soraya ( Mozhan Marnò), que pretende se livrar dela para poder se casar com uma menina de família rica. Sim, ele causa a morte de sua própria mulher para começar um outro relacionamento com uma criança. De certo, é algo absurdo para qualquer pessoa minimamente civilizada, no entanto, o casamento entre homens e crianças são comuns no Irã e em outros países islâmicos, assim como o apedrejamento, que ainda são temas de notícias em 2022 na mídia ocidental. Essa história é baseada no livro do jornalista Freidoune Sahebjam, que no filme é interpretado por Jim Caviezel.
É importante dizer que o texto dos Nowrasteh é construído quase como um thriller em que a tensão aumenta a medida que o tempo passa. Claro que o climax é previamente conhecido pelo espectador, já que ele está descrito no próprio título da obra. No entanto, tudo que acontece até o apedrejamento é digno de um suspense psicológico ou de um terror assustador, não só pelo ato executar uma pessoa com pedras, mas sobretudo pela naturalidade com que a execução é tratada por todo o povo de um vilarejo remoto. Deus manda que seja assim, então não há o que discutir.
A direção de Cyrus Nowrasteh, por sua vez, transforma Soraya em uma espécie de Jesus Cristo cheia de pureza perante uma sociedade que quer executá-la. Antes da morte, há a espera pelo veredito, toda a preparação de seu corpo — que é coberto com vestes brancas —, e depois uma via crúcis em meio ao povo sedento por seu sangue, que eles dizem ser de uma prostituta. Tudo isso em poucos cortes e com planos próximos aos personagens. Também são nesses momentos, bem antes das pedras, que a desfiguração de seu rosto começa, principalmente quando ela se olha em um espelho quebrado ou quando o desespero é aparente através de suas expressões, que são enquadradas em primeiríssimo plano. Quando as pedras são atiradas, a câmera não desvia seu “olhar”. Ela filma explicitamente o sangue tomando conta da protagonista.
“O Apedrejamento de Soraya M”, portanto, é sobre a jornada e o sofrimento de uma mulher inocente até a morte encomendada pela religião, e sobre seus executores amparados pelo divino, como o marido, que está sempre manuseando cuidadosamente as pedras de seu rosário, um objeto que o aproxima de Alá e, ao mesmo tempo, um instrumento que externa o seu caráter calculista. O plano dele dá certo, assim como dá certo toda a opressão imposta à figura feminina em países que usam de fábulas para justificar seus crimes.
“O Apedrejamento de Soraya M”, infelizmente está fora do catalogo das principais plataformas de streaming.
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