Martin Scorsese teve seu nome atrelado, através dos anos, aos filmes de máfia. Clássicos como “Os Bons Companheiros” e “Cassino” ajudaram a criar a imagem dos mafiosos como temos hoje, tanto em termos de aparência como também de comportamento. Diferente do épico “O Poderoso Chefão”, Scorsese não mostrava interesse pelo alto escalão do crime organizado, por seus líderes, mas por aqueles de menor importância. O diretor sempre quis mostrar o ponto de vista do gângster de baixa hierarquia, sem romantizar seus comportamentos e desconstruindo certa elegância e garbo daquele universo que Francis Ford Coppola deu em seus filmes. Scorsese, no entanto, andava afastado desse tipo de cinema fazia algum tempo. O que “O Irlândes” tem a dizer? Como ele se coloca perante o legado de uma filmografia praticamente irretocável, como é a do diretor ítalo-americano?
A boa notícia é que o novo longa-metragem traz um Martin Scorsese que lembra suas obras já aclamadas do passado, mas que traz muita maturidade e sensibilidade dentro do gênero e estética apresentados. A idade talvez tenha feito bem ao renomado diretor, ao mesclar violência e crueza de elementos gráficos em tela com momentos tão ternos e sutis, como as emocionantes sequências finais. Elementos já conhecidos do público, como a longa e densa construção dos personagens de tela estão presentes, tornando as figuras representadas por Robert De Niro, Al Pacino e Joe Pesci muito reais. Não só temos atuações excelentes como o roteiro sabe explorar anos a fio em suas vidas, mostrando desde cenas mais comedidas e cotidianas até momentos decisivos e importantes daquelas pessoas. A duração da projeção, que passa das três horas, se justifica nesses aspectos e não se mostra exagerada. Dentro do corte proposto pelo realizador, a duração se faz necessária e faz com que ele alcance aquilo que deseja constituir enquanto obra. Apesar do foco ser em seus protagonista, aqui interpretado por De Niro, Scorsese mostra enorme vontade que seu filme seja também sobre os outros que o rodearam. De certa forma, “O Irlandês” é uma janela para a vida da trinca principal de personagens ao longo das décadas, que vai se atrelando – por coincidência ou não – à história dos Estados Unidos.
Aliás, a trama é desencadeada pelas falas e narração do protagonista, no momento presente, e que então vai contando episódios de sua vida em ordem cronológica. As transições, passagens do tempo, vão se constituindo a partir de imagens de arquivo e das diferenças mostradas pelas maquiagens e figurinos nos atores. É bastante impressionante como o espectador consegue diferenciar as décadas em que o filme vai se passando com base nesses elementos visuais que, mais uma vez, vão criando um universo tátil e muito próximo ao nosso. Scorsese é muito feliz em criar personagens humanos, verossimilhantes e com trajetórias bem consolidadas, e faz o mesmo com o mundo em que os insere. Isso, claro, sem mencionar alguns diálogos com referências que também localizam o público temporalmente.Nesse aspecto, só é perdida força com o recurso de tornar atores mais jovens por meio de computação gráfica, que deixa a desejar vez ou outra.
No mais, “O Irlandês é um grande filme, digno dos outros também filmados pelo mesmo diretor. É denso, instigante e bem construído, funcionando como um grande drama épico envolvendo crime família, temas já recorrente vistos mas com releitura espetacular por parte do roteiro e da linguagem audiovisual aqui composta. Constará, certamente, como um dos melhores de 2019.
Imagens e Vídeo: Divulgação/Netflix
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