Um Drácula diferente vindo da Romênia
A imagem concebida por Hollywood de Drácula permanece vívida na memória de inúmeros cinéfilos aficionados por produções de terror com temática vampiresca. A construção do personagem como um dos ícones monstruosos da Universal é reconhecida globalmente, não apenas por seu apelo fantasioso e frequentemente sedutor, mas sobretudo pela apropriação cultural promovida pelos Estados Unidos, que o converteu em um produto altamente lucrativo. Assim, a narrativa de Vlad, o Empalador serviu como alicerce para a criação de sua mitologia, distanciando-se gradualmente de sua terra natal, a Romênia, para se integrar à engrenagem da cultura pop capitalista.

Com o intuito de resgatar o personagem das garras comerciais americanas, o cineasta Radu Jude decidiu apresentar sua própria interpretação de Vlad/Drácula — uma versão que, definitivamente, não guarda semelhança com a de Bram Stoker adaptada por Coppola. Para o espectador desavisado, esse “Drácula” pode soar profundamente frustrante, uma vez que não se trata de um filme de terror repleto de cenas tensas e aventuras sombrias. Aqui, o tom predominante é satírico, permeado por críticas sociais e políticas contundentes.
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O vampiro de Jude — ou melhor, os vampiros, uma vez que múltiplas versões emergem ao longo da trama — representa o mercado capitalista, a estrutura religiosa, os avanços tecnológicos e até mesmo a esfera artística. A correlação entre o ser que suga sangue e os sistemas mencionados é evidente, embora seja abordada com sarcasmo pelo personagem de um roteirista, que relata os eventos enquanto requisita a uma inteligência artificial inovadora a geração das imagens e do texto do longa-metragem que é exibido na tela. Em determinado momento, ele afirma que os espectadores mais perspicazes rapidamente farão essa associação, embora o propósito de seu roteiro seja estritamente comercial.

Nesse contexto, “Drácula” transforma-se em uma metralhadora giratória, disparando humor escatológico de forma incessante até os créditos finais. Quem já está habituado ao estilo narrativo do diretor romeno reconhece sua abordagem peculiar, mas neste caso, o longa torna-se excessivamente exaustivo devido à recorrência das mesmas piadas ao longo de quase três horas de projeção. É possível que ele tenha a intenção de vencer o público pelo cansaço, imprimindo sua mensagem na mente de cada espectador; entretanto, muitos podem simplesmente abandonar a sessão antes da conclusão.
Dessa forma, Jude mais uma vez recorre à sua veia punk para compor um mosaico de críticas à sua nação e ao cenário global, embora desta vez pareça ter exagerado na dose. Uma duração mais concisa talvez favorecesse a recepção da obra, sem comprometer sua essência. Afinal, em certas ocasiões, menos é mais.
Este filme foi visto durante a 49ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.
Vídeo: Divulgação/ Film Fest Gent

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