Filme com Juliette Binoche, “Entre Dois Mundos” constrói uma crítica social relevante
No longa “Entre Dois Mundos”, dirigido por Emmanuel Carrère, a escritora Marianne Winckler (Juliette Binoche) decide realizar uma pesquisa de campo para sua próxima obra, que abordará a vida dos trabalhadores assalariados franceses, sobretudo das profissionais de limpeza. Para isso, ela resolve colocar-se no lugar delas e aceita diversos empregos temporários, incluindo a higienização de banheiros públicos, residências e cabines de navios. Durante uma dessas tarefas, Marianne estabelece uma amizade com Chrystèle (Hélène Lambert) e Marilou (Léa Carne), o que transforma o que seria apenas um estudo sociológico em algo mais profundo.
O roteiro, escrito pelo próprio Carrère em colaboração com Hélène Devynck e Florence Aubenas, volta-se para a existência daqueles que são figurantes no mundo real, especialmente em uma França elitizada e excessivamente glamourizada aos olhos internacionais. “Entre Dois Mundos” busca retratar uma fração do trabalho precário exercido por parte da população, assim como a realidade das periferias, habitadas por quem depende de auxílio governamental para subsistir. Nada que já não tenha sido explorado pelo cinema francês, conhecido por suas reflexões sociais e políticas, mas aqui o foco reside no conflito entre os dois universos sugeridos pelo título.
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A perspectiva burguesa de Marianne chega a ser ingênua no início da história, mas revela-se profundamente cruel no terceiro ato. Em determinado momento, a protagonista declara estar farta de apenas ouvir sobre as adversidades sociais e resolve experimentá-las, considerando isso um gesto nobre. No entanto, sua atitude não passa de uma instrumentalização das novas amigas, reduzidas a cobaias para fins literários e até capitalistas, já que seu objetivo final não é amplificar as vozes daquelas mulheres, mas vender livros que cativem outros burgueses ávidos por espiar a vida dos que os servem.
A escolha de Binoche como protagonista serve bem ao propósito do filme, pois ver uma das atrizes mais célebres, refinadas e burguesas do mundo limpando vasos sanitários enquanto observa suas colegas com condescendência é emblemático para a temática. Em certos momentos, esquece-se a personagem e pensa-se apenas na intérprete, que talvez nunca tenha limpado um banheiro de verdade em sua vida. Contudo, esse raciocínio deve ser rapidamente descartado, pois a culpa pelo estado da sociedade contemporânea não é de Binoche.
Na verdade, diferentemente da escritora que ela interpreta, sua intenção real é expor e sacudir aqueles que ainda acreditam que suas vidas luxuosas não dependem do labor exaustivo da maioria, que trabalha sem descanso, férias ou remuneração justa. O trabalho incessante rouba dessas pessoas a oportunidade de viver, e o filme ilustra isso com Chrystèle, cujos turnos são tão extenuantes que ela sequer tem tempo de ir à praia com os filhos.
Assim, “Entre Dois Mundos” é pintado com tons neorrealistas por Carrère, que direciona sua câmera sem os floreios de um cinema burguês em sua linguagem centenária. Para ele, seria fácil preencher sua mise en scène com planos abstratos e cores que remetessem ao sofrimento dos personagens, como já fizeram diversos cineastas da elite hollywoodiana. Aqui, porém, ele prefere testemunhar o métro-boulot-dodo — ainda que muitos nem mesmo tenham acesso ao metrô, obrigados a percorrer longas distâncias a pé.
Imagem Destacada: Divulgação/Pandora Filmes

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