Pablo Larraín vem se especializando em cinematografias de divas com “Spencer”, “Jack” e agora “Maria Callas”. Nessa trilogia informal, o que se pode denominar como terceiro capítulo é um recorte melancólico dos últimos dias de vida da soprano greco-americana, em um apartamento parisiense, onde está acompanhada apenas de seu mordomo e de sua governanta, os últimos das plateias a testemunhar suas apresentações. Larraín, que selecionou outra diva para o papel, Angelina Jolie, utiliza sua câmera de maneira sensível, acompanhando a personagem com movimentos suaves e mínima interferência da montagem. Seu estilo faz com que o espectador tenha a impressão de flutuar ao redor de uma entidade divina. Essa abordagem é pertinente, uma vez que Callas pode ser considerada uma deusa.

Entretanto, na realidade, até mesmo as divindades padecem de solidão, de amores perdidos e de doenças que comprometem o funcionamento de seus corpos; no caso de Maria, a situação é ainda mais trágica, pois tudo isso a priva de sua capacidade de cantar. Amargurada e presa a memórias de um passado não tão distante, repleto de glamour e sucesso, ela começa a se entregar aos medicamentos, que consome em abundância. O mordomo, interpretado com sensibilidade por Pierfrancesco Favino, tenta auxiliá-la, mas suas tentativas parecem fúteis. Assim, o público acompanha, com o coração partido, a decadência de uma estrela.
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É interessante notar que, mesmo com toda a tristeza da personagem, a fotografia de Ed Lachman é composta por cores vibrantes e quentes, que realçam uma Paris primaveril e acolhedora. Embora se trate de uma paleta comum ao retratar os anos 70, Larrain a seleciona para criar um contraponto entre a cidade colorida e a psicologia de Callas, que já se encontra na obscuridade. Além disso, a dicotomia serve para mostrar a superfície de uma cidade que parece amá-la, mas a persegue por meio de sua imprensa sensacionalista e de um público cruel. A beleza das cores, portanto, oculta a intolerância com uma artista em declínio.

“Maria Callas” é brutal e provoca uma profunda tristeza após seu desfecho arrebatador, ainda mais por contar com uma atriz que consegue, por meio de uma atuação dramaticamente consistente, transmitir as dores de uma artista no ato final de sua apresentação neste mundo. Jolie expressa a melancolia de sua personagem com uma entonação de voz que parece exausta, mesmo quando tenta realizar aquilo que mais ama: cantar. As cenas angustiantes são trabalhados de maneira contida e não há exageros por parte da atriz quando a possibilidade de tragédia se apresenta.
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Dessa forma, Callas é eternizada nas telas modernas, mesmo que no momento mais cruel de sua vida. Larraín, portanto, mais uma vez alcança uma retratação consistente em um cinema que se mostra cada vez mais maduro em sua concepção.
Filme assistido na 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo
Imagem em destaque: Divulgação/Diamond Films Brasil

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