Estreia neste Halloween um dos filmes mais aguardados do ano, “Megalópolis” do lendário roteirista, produtor e diretor Francis Ford Coppola realizador da trilogia “O Poderoso Chefão”, “Apocalipse Now,” “A Conversação”, “Drácula de Bram Stoker” entre outras obras que fazem parte do imaginário da maioria das pessoas que amam cinema pelo mundo.
Megalópolis especificamente, foi um sonho alimentado pelo diretor por décadas inclusive com essa superprodução tendo sido bancado por ele mesmo com impressionantes U$ 100 milhões, algo raro em uma indústria cada vez mais construída por blockbusters financiados por conglomerados bilionários ou joint ventures envolvendo diversos países.
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E é nesse clima de esforço e obsessão que se constrói essa fábula sobre um homem que deseja construir a utopia perfeita através da integração e sustentabilidade da cidade de Nova Roma, uma metáfora nada sutil sobre a forma como os Estados Unidos da América se colocam hoje, como a maior potência econômica, exportando sua língua e cultura para todo mundo em contrapartida do que significou séculos atrás a Roma antiga dos césares e imperadores, inclusive nomeando a maioria dos seus personagens como nomes de origem grega-romana (Cassius, Clódio, entre outros nomes).
Cesar Catalina o protagonista, um artista egocêntrico e narcisista que desfila em meio a toda decadência da cidade é só uma das muitas obviedades e falta de sutilezas do filme, que se move pela tela num misto de sensações, exageros e eventualmente filmado de forma impressionante por seu diretor.
Pois Megalópolis se traduz completamente como uma obra do seu criador e como ele enxerga o estado das coisas no mundo hoje, sem nuances, com todos os personagens delimitados pelas suas aparências e funções, sejam elas de pessoas abastadas e privilegiadas (a maioria dos personagens principais) ou as que são relegadas ao papel de narrador das histórias desses “deuses”.
Para Coppola nessa obra não cabe a dúvida, não há outro lado a escolher e mesmo hoje onde os contos de fadas se permitem revisões entre vencedores e perdedores, heróis ou vilões nesta fábula não há distinção: ou se é um sonhador, um oprimido ou um opressor.
Hoje em dia com séries de televisão, peças de teatro ou filmes (inclusive de super heróis) tão diversos, com exemplos prodigiosos que permite o mistério entre protagonistas dúbios e antagonistas que geram um misto de atração e repulsa, chega a ser anacrônico o uso de personagens tão unilaterais em um filme tão grandioso.
E isso cobra o preço dos diversos talentos que estão na obra como Adam Driver, bom ator com grande presença de cena que às vezes parece perdido entre seus delírios de grandeza e a compreensão de sua missão, mesmo que seu lado de artista genial seja alardeado por toda projeção.
Shia LeBouf ator interessante, constrói um inimigo queer que gera mais pena que ameaça, além de todos na história terem certeza de que foi ele quem realizou as maiores armações no filme…
Ora, se ele como o primo do protagonista não consegue enganar nem os personagens fictícios que o circundam, ou se trata de uma idiotice de todos naquele mundo ou em erro na concepção dos outros personagens constituídos por banqueiro bilionários, gênios arquitetônicos, políticos velhacos e populistas…
Socialites interesseiras, mocinhas ingênuas se envolvendo como homens suspeitos de feminicídio, massas de pessoas manipuláveis por discursos de ódio que inclusive são bem parecidos com os de certo um político da realidade e do próprio Estados Unidos concorrendo à presidência…
É notável que Coppola a essa altura da vida e do seu legado, se preocupe um produzir algo tão grandioso à margem dos grandes estúdios de produções cada vez mais pasteurizadas ou baseadas em franquias ou produtos consagrados, porém falta algo em Megalópolis que sobra nesses próprios filmes com que rivaliza, a sutileza, a ironia, o sorriso pelos absurdos das situações que se apresentam na tela.
O registro não precisava ser todo em torno da ironia, senão apaixonado e dedicado como Coppola sempre foi beiraria ao cinismo, mas poderia ter algo mais além do exagero brega de sentimentos exacerbados e declamados na maioria das vezes como em uma peça da Roma antiga e que seria melhor encaixada nos anos 90, não nesta década com tantas obras lapidadas para uma observação mais arguta do mundo.
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Porém, é a materialização do sonho de um sonhador, o delírio coletivo de um homem só, que se transforma em uma obra que há muitos anos não vemos e que merece o benefício de ser apreciada onde seu criador prefere que seja vista, em uma tela de cinema.
Que pena que independente do resultado, filmes assim sejam uma rara exceção.
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