Quando os bombeiros e para-médicos chegaram havia muito pouco para se fazer. O corpo em chamas era consumido pelo fogo avassalador. O sangue escorria em versos pelo chão, palavras contidas se esgueiravam pelos cantos do coração e não ousavam saltar para fora num leal pacto de silêncio. Na mente, palavras perdidas vagavam esperando o fim do tormento, não podiam trair àquele que confiara na promessa de guardar para sempre o segredo. Bastava que ela soubesse que a cada dia, quando o sol surgisse, que aquele amor era alimentado pelo calor intenso de uma paixão imensa desde alvorecer, passando pelo alto da sua plenitude sem nunca desvanecer no crepúsculo.
Quando finalmente o fogo foi controlado, o corpo mesmo carbonizado mostrava um estranho sorriso no rosto desfigurado, uma postura orgulhosa de uma mensagem passada com êxito que dizia que o amor não morrera. Fora apenas a paixão reprimida que explodiu de repente fugindo ao controle do consciente. Nada havia acabado. Embora a paixão tenha consumido todo o seu corpo e sua carne dilacerada, o amor, o amor continuava intacto, no ar que só ela respira. No rescaldo, apenas os versos, os versos de amor sobreviveram no meio das cinzas.
Por Ivo Crifar
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