É possível que a agenda de um adolescente tenha assunto suficiente para ser transformado em livro? Sim, é possível. E não se trata de um adolescente Youtuber com uma pequena biografia para dividir um pouco da sua vida com os fãs. O adolescente em questão não era famoso e poucos amigos e familiares devem tê-lo considerado importante. Ele não era conhecido pelo Brasil e pelo mundo, não era um jovem da mídia.
Lucas Medeiros Bonjardim, um adolescente que estava para completar dezessete anos, morre em um grave acidente de carro a caminho de Nova Petrópolis, no Rio grande do Sul. Infelizmente, não se trata de ficção. O ocorrido foi em 15 de outubro de 1997 na Rodovia RS-476 e chocou amigos e parentes que aguardavam a sua chagada na cidade de Gramado, justamente para comemorar seu aniversário.
É difícil imaginar que alguém que morreu tão jovem possa ter deixado algum legado, porém Lucas deixou sem querer um material que deu origem à uma obra sensível que fala de diversos temas bastante atuais, tais como descritos na contra capa: “Sensível drama familiar que aborda a morte, o amor filial, fraternal, erótico, a iniciação sexual, o homossexualismo, Aids, solidariedade, respeito, cidadania, adultério, alcoolismo e outras drogas, dinheiro e consumo.”
Sim, todos esses assuntos são encontrados na agenda de um adolescente na forma de desabafo, perguntas que lhe foram ou não respondidas, recortes de jornais, letras de músicas, fotografias, anotações e tudo mais que se poderia encontrar dentro da uma agenda de um garoto de dezesseis anos.
Para quem não está acostumado com a palavra “agenda”(a não ser que ela signifique uma lista de horários e compromissos a serem cumpridos), ela era praticamente a rede social do jovem e do adolescente, onde eram registrados todos os acontecimentos, trocavam-se mensagens e se anotavam lembretes e até os famosos memes marcavam presença por esses papéis.
A agenda de Lucas foi transformada em livro por Júlio Emílio Braz, ilustrador e escritor de literatura infanto-juvenil. A pedido de uma amiga, o escritor resolveu ler as cópias dos papéis entregues a ele por um gesto de boa vontade e acabou caindo de paixão por ser, segundo suas próprias palavras:
“leitura fácil gostosa, retrato sem maiores retoques de um adolescente como qualquer outro deste mundo.”
Realmente é uma leitura fácil e é capaz de prender o leitor pela simplicidade das palavras e, ao mesmo tempo, a complexidade de alguns assuntos abordados. Algumas questões fáceis de se responder, outras mais difíceis, porém, para um adolescente, é um turbilhão de pensamentos que acabam deixando uma mente tão jovem um tanto confusa. Os vários recortes de jornais e revistas, alguns panfletos anexados às páginas também ajudam bastante a entender as dúvidas e angústias vividas por Lucas. A sua letra pode ser vista em algumas páginas, intercalada com o texto impresso, o que traz certa proximidade com o autor e nos ajuda lembrar que estamos diante dos desabafos na agenda de um adolescente que um dia esteve entre nós.
Lucas divide com seu mundo de papel algumas pequenas aventuras de meninos da sua idade, as brigas e risadas com os amigos, a dificuldade de lidar com o fato de seu irmão mais velho ser sempre citado como um exemplo enquanto ele se sentia constantemente julgado e pressionado, as paixões não correspondidas, as várias descobertas e experiências boas e ruins, enfim, é a cabeça de um jovem transmitida para o papel. E com certeza não é nem a metade, pois, além das páginas que com certeza foram omitidas para poupar a privacidade do jovem falecido e também a dor da família, muita coisa pode não ter sido escrita, pois nem sempre conseguimos transmitir o que se passa dentro de nós, mesmo em segredo para nós mesmos.
Uma leitura fácil. Porém, nem sempre leve, mas que vale a pena.
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