“Presos que Menstruam” é um livro que queríamos ler desde a época de seu lançamento, em 2015. Ele levou cerca de cinco anos para ser concluído e nele há relatos pessoais das detentas entrevistadas, assim como informações muito interessantes sobre o sistema carcerário feminino e suas condições.
Lemos “Presos que menstruam” em poucas horas envolvidos pela escrita da autora e pela curiosidade em relação a vida dessas presas. No entanto, é difícil dizer que o amamos ou mesmo admitir prazer com a leitura diante de um conteúdo tão pesado.
A ideia do livro surgiu durante uma conversa entre a jornalista Nana Queiroz e Rosália Naves, que trabalhou durante muitos anos no sistema carcerário feminino nacional. Curiosa com as histórias que ouviu, Nana foi atrás de mais informações sobre, mas o que encontrou foram poucos dados e um grande silêncio relacionados ao tema.
Desse silêncio, Nana pegou para si a tarefa de pesquisar mais a fundo e encontrar respostas para as suas perguntas. Diferente de “Rota 66“, do também jornalista Caco Barcellos, o livro de Naná nos oferece um olhar muito mais íntimo e gira em torno de histórias reais narradas por algumas das detentas entrevistadas. Em paralelo a isso, Naná também nos oferece alguns dados sobre a realidades dessas mulheres.
“É fácil esquecer que mulheres são mulheres sob a desculpa de que todos os criminosos devem ser tratados de maneira idêntica. Mas a igualdade é desigual quando se esquecem as diferenças. É pelas gestantes, os bebês nascidos no chão das cadeias e as lésbicas que não podem receber visitas de suas esposas e filhos que temos que lembrar que alguns desses presos, sim, menstruam.”
Em “Presos que Menstruam”, a intenção não é vitimizar ou defender a inocência dessas mulheres, mas expor que, ainda tenham cometido crimes, não justifica os abusos que sofrem do sistema penitenciário. Uma ideia que é ignorada não só pelas instituições públicas, mas também pela opinião popular com a frase “bandido bom é bandido morto”.
O modo como a jornalista escolheu escrever esse livro, a partir da narrativa das presidiárias, é uma tentativa de demonstrar que elas são seres humanos e não monstros que precisam ser extintos da sociedade. A empatia, para Nana, era essencial. Havia sempre uma tentação de julgar, de se colocar em uma posição moralmente superior até que Nana conheceu a detenta Safira.
O livro é dividido em pequenos capítulos focados em presas e prisões diferentes. Ao longo da leitura, no entanto, vemos que o essencial é nos atermos ao relato e não tanto à personagem. Nana tentou caracterizá-las o máximo que pôde, sem comprometer o sigilo ao qual haviam concordado, mas conforme avançavámos na leitura, percebíamos que muitos se misturavam. Muitas das presas passaram pelas mesmas situações ou haviam vivido em cenários muito parecidos.
Mais do que uma espiada no passado dessas presas, a proposta central do livro é mostrar como o sistema carcerário brasileiro trata as mulheres com precaridade e ignora questões de gênero, oferecendo a elas tratamento muito similar ao masculino, inapto para tratar adequadamente de temas intrínsecos ao univerno feminono como menstruação e maternidade. Além de também falar um pouco do impacto em suas famílias e o dia a dia na prisão.
Apesar da maioria serem presas desconhecidas, mas com crimes recorrentes, Nana tem a oportunidade de conversar com presas famosas como Suzane Von Richthofen, que matou os pais, e Anna Carolina Jatobá, condenada pelo assassinato de sua enteada, a menina Isabella Nardoni.
Diversas vezes são levantados pontos quanto a necessidade de atividades educacionais, trabalho, tratamento com psicólogo além de outros recursos que preparassem o detento para voltar a viver em sociedade sem que ele tivesse que recorrer ao crime mais uma vez. Além disso, entre os anos de 2007 e 2012, dados do Ministério da Justiça mostraram que os delitos mais comuns cometidos pelas mulheres foram aqueles que poderiam funcionar como complemento de renda.
Outra problemática é a reabilitação. Enquanto para muitos homens são presos e suas famílias continuam em casa, aguardando o dia de seu regresso, para a mulher a história é outra. A maioria perde marido e casa, muitas vezes até os filhos que são distribuídos entre familiares e abrigos. A mulher, portanto, sai da prisão e precisa reconstruir seu mundo.
Depois de três anos de publicação, o livro agora se prepara para virar filme e talvez uma série. Em 2016, ele estava em fase de captação de recurso e no final do ano passado os produtores estavam reunindo atores e atrizes negros que quisessem participar para darem início as filmagens.
Por Paula Arbex
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