Se há um critério no escritor que chama a atenção da crítica é sem dúvida a originalidade. No que diz respeito à inovação, Augusto dos Anjos é mestre! Além de autor de um único livro, “Eu”, seu conteúdo carregado de metáforas escatológicas jamais tinha sido visto desde antigamente até os dias atuais.
Paralelamente ao estilo do início do século XX, que cultuava o clássico, seguindo e venerando a prática de uma literatura baseada na norma culta, o poeta paraibano apresenta um “eu lírico” que se distancia das tradicionais concepções estéticas.
Os predicados e a qualidade de seus versos romperam com o padrão da palavra nobre ao dar vazão à poesia do desgosto, da derrota e do enfermo: “como um chacal saciando o eterno instinto vou saciando a minha fome eterna” (Mártir da fome) ou mesmo “como um fantasma que se refugia na solidão da natureza morta” (Solitário). E quase sempre se utilizava de um vocabulário repleto de termos científicos e técnicos para descrever doenças e falar sobre micróbios, sangue e vermes.
Sem dúvida nenhuma, Augusto dos Anjos foi um dos grandes precursores da poesia moderna abrindo caminho para temas obscuros que a sociedade até hoje tem medo de enfrentar.
Você pode encontrar diversas edições do livro “Eu”, escrito em 1912, inclusive em PDF.
Versos íntimos
Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão – esta pantera –
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
(Augusto dos Anjos)
Por Susana Savedra
Quer estar por dentro do que acontece no mundo do entretenimento? Então, faça parte do nosso CANAL OFICIAL DO WHATSAPP e receba novidades todos os dias.