O que Katy Perry não deixa faltar em simpatia sobrou em atos confusos e menos animados
Katy Perry voltou ao Brasil pela sexta vez para se apresentar no The Town 2025, em São Paulo, e mais uma vez reafirmou a relação especial que tem com o público brasileiro — foram muitas suas declarações de amor ao longo da performance. Ao longo de sua trajetória, a artista construiu uma carreira marcada por grandes sucessos pop, como “Teenage Dream”, “Roar” e “Firework”, mas também por altos e baixos que a tornaram uma figura complexa dentro da indústria.
De ícone absoluto dos anos 2010, Perry passou a ser alvo de críticas mais contundentes a partir do álbum “Witness” (2017), e desde então convive com a dualidade entre sua reputação de estrela camp e os questionamentos sobre os limites entre provocação estética e simples excessos na direção artística.
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No palco do The Town, o repertório foi fortemente pautado pelo mais recente álbum, “143”. A decisão não vem sem controvérsias: o disco é o menos bem avaliado de sua carreira segundo o Metacritic, muito em função da colaboração com o produtor Dr. Luke, que contrasta diretamente com o discurso de empoderamento feminino que a cantora sempre defendeu.
De fato, há motivos para parte das críticas — o discurso de Perry no álbum soa por vezes plástico e performático. Ainda assim, não deixa de haver um efeito manada nesse processo: 143 está longe de ser um trabalho irreparável e, em certos momentos, se mostra mais coerente do que a rejeição massiva dá a entender. Até mesmo o bastante criticado “Smile” (2020), considerado “pequeno”, parecia mais redondo e coeso em comparação.
Pontualmente às 23:15, a californiana subiu ao palco ao som de “Artificial”. Costuma-se comentar como o primeiro verso de um poema épico tende a condensar a ideia do todo e podemos dizer que foi um pouco disso aqui: mesmo abatido pelo horário, alguns esperando há horas em pé, o público vibrava animado com a chegada da artista, porém poucos eram os que sabiam dos versos da canção que, sim, integra o 143.
A energia subiu com “Chained to The Rhythm” — curiosamente um single muito criticado por fãs na época do lançamento, mas que envelheceu muito bem, pelo visto. Só que daí voltou a montanha russa: “Teary Eyes” seguida por “Dark Horse” — nesse show, também, o público cantou em plenos pulmões “meu nome é Júlia“, e Katy ainda deu corta — ela não é inocente.
Para não ajudar, o show foi dividido em seis atos, dando tempo para preparação de palco e troca de figurino enquanto eram exibidos vídeos com um storytelling com o conceito do álbum, bem nível “Xuxa e os Gnomos”, só que ruim — essas sequências não só eram cansativas quanto seriam melhor recebidas se o dito conceito fosse bem amarrado — o resultado final é de uma playlist sem muita coerência.
Entre os blocos, “Woman’s World” talvez tenha sido o momento mais consistente e impactante, e emendou uma sequência implacável que nenhum outro artista vivo no pop possui — isso porque Katy está igualada com Michael Jackson colocando cinco de seus seis singles do “Teenage Dream” no primeiro lugar do top 100 da Billboard — e embalou o ponto alto da setlist: logo após “WOMAN’S WORLD”, que a galera até pode ter reclamado, mas conhecia, veio “California Gurls”, “Teenage Dream”, “Hot n Cold”, “Last Friday Night (T.G.I.F.)” — essas últimas duas bricoladas como em um medley — e, por fim, uma dedicatória à comunidade LGBT com “I Kissed a Girl”.
O “nível 3”, “Nirvana” já foi um balde de água fria. Entre um “e aí” e um “te amo, Brasil”, o público foi se esvaziando, o que foi um crescendo até próximo do fim quando uma outra faixa menos conhecida era tocada; as câmeras aéreas podem até disfarçar, mas teve ponto que virou pista de dança. Foi a vez de “NIRVANA”, “CRUSH”, “I’M HIS, HE’S MINE”, “Wide Awake”.
Apesar dos rodeios questionáveis, a parte seguinte, “Choose Your Own Adventure” foi uma graça: trouxe uma criativa experiência gamificada em que a plateia, através de um QR code, seleciona qual vai ser a música “exclusiva” da performance.
Na ocasião, o álbum pré-selecionado foi o “Smile”, e Katy fez um a cappella curtinho com todas as faixas antes de revelar o ganhador, inclusive a intrusa “Peacock”, que fez algum sucesso aqui e nem single foi — parecia até presente da cantora aos brasileiros, mas é uma coincidência: ela tem resgatado a faixa nos shows dessa turnê, em que aproveita para contar que parou de cantar essa música e que sua filha, Daisy, ficava cantando-a. Enfim, nem “Smalltalk”, nem “Hummingbird Heartbeat”, “Only Love”, “Resilient”, ou “Never Really Over”, a escolhida foi “Harleys in Hawaii”.
Foi nessa parte do show que Katy Perry resgatou uma tradição já conhecida de suas passagens pelo Brasil: chamar um fã ao palco. O escolhido da vez foi André, de Itaquaquecetuba, que carregava uma bandeira temática da Lifetimes Tour com a bandeira do Brasil e contou que também estará presente nos shows em Brasília e Curitiba. A interação rapidamente se transformou em um dos pontos mais divertidos da noite: arrancou risadas da plateia ao ensinar a cantora a dizer “eu sou gostosa” em português e ainda participou ativamente da performance, assumindo a percussão em “The One That Got Away”.
Nessa altura já tinha ficado claro àqueles que viram os “spoilers” que a performance seguiria o esquema da tour, pois o ato seguinte, um dos mais confusos, trouxe mais três grandes títulos: “E.T.”, “Part of Me”, “Rise”, pouco relacionados entre si, contudo. Os hits mais marcantes tinham que ficar para o final, sanduichando “Daisies” e “Lifetimes”, “Roar” e “Firework” fecharam a segunda edição do The Town com uma plateia ainda bem animada às 1 da manhã e a despeito dos problemas técnicos com o ajuste da voz de Katy na aparelhagem.
Visualmente, o espetáculo manteve a marca registrada de Katy Perry: figurinos chamativos, cenografia colorida e um senso teatral que flerta com o lúdico e o exagerado. Mesmo com as críticas, a artista segue sabendo como transformar o palco em um grande parque de diversões pop, algo que poucas cantoras de sua geração conseguem sustentar com a mesma espirituosidade.
Confira setlist completa
- ARTIFICIAL
- Chained to the Rhythm
- Teary Eyes
- Dark Horse
LEVEL 2: WOMAN’S WORLD - WOMAN’S WORLD
- California Gurls
- Teenage Dream
- Hot n Cold
- Last Friday Night (T.G.I.F.)
- I Kissed a Girl
LEVEL 3: NIRVANA - NIRVANA
- CRUSH
- I’M HIS, HE’S MINE
- Wide Awake
LEVEL 3.5: CHOOSE YOUR OWN ADVENTURE - Small Talk (snippet; a cappella)
- Hummingbird Heartbeat (snippet; a cappella)
- Peacock (snippet)
- Only Love / Resilient / Never Really Over (a cappella)
- Harleys in Hawaii
- The One That Got Away
- ALL THE LOVE
LEVEL 4: MAINFRAME - E.T.
- Part of Me
- Rise
LEVEL 5: ENDGAME - Roar
- Daisies
- LIFETIMES
- Firework (com elements de “Wonder”)
Imagem Destacada: Divulgação/The Town 2025 (Moriva/Wesley Allen)
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