“A Família Addams” surgiu em 1938 como um conjunto de charges desenhadas pelo cartunista Charles Addams para a revista “The New Yorker”. Entretanto, as personagens ganharam fama internacional quando foram adaptadas para a televisão, em uma sitcom que durou de 1964 a 1966, na qual foram introduzidos não só os nomes de cada membro do clã, mas também elementos icônicos de seu universo, como a imediatamente reconhecível música-tema. Além disso, foi a partir daí que “A Família Addams” passou a ser sinônimo de um equilíbrio bastante específico: ao mesmo tempo em que investia em um mórbido e satírico humor negro, havia também uma leveza que permitia às personagens fazerem sucesso tanto com adultos quanto com crianças. Infelizmente, é a falta desse equilíbrio que prejudica enormemente a mais nova adaptação cinematográfica dessa franquia.
Teoricamente, a escolha por fazer um longa de animação baseado nas personagens criadas por Addams faz bastante sentido, uma vez que, ao se desgrudar completamente do mundo físico, essa técnica garante aos realizadores uma maior liberdade, permitindo-os explorar das maneiras mais extremas e absurdas as idiossincrasias desse universo. Porém, apesar de algum elemento interessante no design de personagens (as tranças de Wandinha com formato de forca) ou de alguma gag visual mais inspirada (o leão da família solto pela cidade; o momento em que Mortícia fica corada e um morcego aparece para sugar seu sangue e devolver-lhe sua palidez natural), no geral, as possibilidades da animação se restringem a criar set pieces megalomaníacos e pouco cativantes, que parecem servir mais de remédio de déficit de atenção para crianças dispersas do que como um inventivo uso da mídia escolhida.
Parte disso se deve ao roteiro esquemático de Matt Lieberman, que parece querer encaixar a qualquer custo as personagens de Addams em uma narrativa à la Dreamworks Animation, misturando humor, sentimentalismo e referências à cultura pop. Entretanto, “A Família Addams” se assemelha aos piores exemplos dessa fórmula, uma vez que o casamento entre IP (propriedade intelectual) e forma não se dá naturalmente. Apesar de investir fortemente em piadas acerca da excentricidade do clã protagonista, dificilmente elas são originais ou particularmente divertidas. Além disso, ao tentar inserir o universo Addams no cenário cultural contemporâneo, os realizadores apostam em referências fáceis, como o balão vermelho de “It – A Coisa”, ou escolhas musicais batidas (o Primo Coisa chegando ao som de “Drop It Like It’s Hot” de Snoop Dogg poderia ter sido engraçado – e, quem sabe, transgressor – há uns dez anos atrás).
Como se isso não bastasse, o subtexto do filme (se é que podemos chama-lo assim) é demasiadamente óbvio, tornando o filme de Conrad Vernon e Greg Tiernan interessante apenas para os mais jovens dos espectadores. Tudo bem que o caráter caricatural das personagens não é necessariamente condizente com sutilezas e sátiras veladas, porém “A Família Addams” faz as escolhas mais óbvias sempre que pode, desde o nome da cidade em que a trama se passa (Assimilação) até a mensagem final, de uma enorme ingenuidade. Logo, excetuando uma tirada inteligente aqui e acolá (Gomez, ao chegar na cidade planejada e tipicamente suburbana, afirma que “não precisamos botar a família num mausoléu; vamos botá-los aqui”), “A Família Addams” sofre de uma previsibilidade abissal.
Por fim, a curta duração (não chega a 90 minutos, incluindo os créditos) e a eventual boa ideia impedem a mais recente adaptação cinematográfica da obra de Charles Addams de se tornar uma total perda de tempo. Contudo, é difícil não perceber esse filme mais como uma tentativa de manter a franquia viva no imaginário coletivo do que fazer algo, de fato, interessante (para todas as idades) com ela.
Imagens e vídeo: Divulgação/Universal Pictures
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