O novo filme de Wim Wenders, “Dias Perfeitos” conta a estória de Hirayama, um faxineiro de banheiros em uma cidade no Japão, vivendo tranquilamente sua rotina dia pós dia. Existe algo elaborado de forma minuciosa em contar a estória de um faxineiro sem romantizar o seu trabalho, oque acontece pelo fato de o discurso do filme não se voltar ao trabalho do personagem, mas a conexão do protagonista com sua rotina.
A obra de Wim Wenders consegue ser uma mistura sútil da estética leve de “O Paraíso deve ser Aqui”(2019) com a condução narrativa de “Jeanne Dielmann”(1975), de ser um filme que cria uma conexão do espectador com o protagonista de simplesmente sentir o prazer de viver a vida na sua maior simplicidade(bem diferente de Jeanne Dielmann nesse sentido).
O filme faz questão de trabalhar detalhadamente a rotina do protagonista, sem nenhum momento fazer com que o tom do filme caia em um drama comum com esse tema, tenta fazer o oposto. Transformar uma rotina simples em um espetáculo nos seus detalhes, quase como uma carta ao espectador falando como é linda a vida se você prestar mais atenção nela.
Oque é enfatizado pela atuação espetacular do ator Kõji Yakusho, que convence o espectador de sempre contemplá-lo e torcer para que nada de ruim aconteça com o personagem. Um efeito brilhante em fazer o espectador se questionar o porquê dessa torcida, sendo que nunca mostra nada que aponte se algo ruim irá acontecer. “Dias Perfeitos” questiona o pessimismo da visão do ocidente sobre a rotina, colocando uma certa esperança no coração daqueles que assistem.
Existe um lado cômico em “Dias Perfeitos” do protagonista não saber como reagir sobre os personagens secundários à sua volta. O protagonista em nenhum momento olha os outros personagens de forma deplorável, mas de tentar entendê-los. E mesmo se não os entenda, o espectador responde apenas com um sorriso ou um olhar, colocando o espectador e o protagonista quase no mesmo lugar. Algo que fica explicito pelo seu hobby fotográfico.
Não esquecendo a habilidade de Wenders em fazer um filme sobre a beleza na simplicidade na vida contendo elementos, em algumas sequências, de cinema experimental sem nenhum formato se sobrepor ao outro. E é necessário enfatizar a importância da trilha sonora e o formato do filme em 4:4 em serem elementos importantes para o resultado certo da obra.
A trilha sendo em sua maioria de músicas das décadas de 70 e 80, e o protagonista sendo distante da tecnologia atual (usando máquina fotográfica antiga e apenas toca fitas em seu carro), mostra alguém em paz mesmo longe de pequenas coisas que uma nova geração se sente desesperada se não tiver na palma das mãos. Algo que acontece sem ser um discurso moralista, mas sobre como é possível viver sem aquilo que a massa considera obrigatório para viver nos dias atuais.
“Dias Perfeitos” é quase uma analogia do que seria o filósofo Sêneca nos dias atuais, mas também como uma fortíssima homenagem ao cinema e o quão presente ele está em nós além das telas de cinema. Seja nos sonhos ou em jogos de sombra nas ruas que andamos e nem percebemos.
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Wim Wenders consegue com maestria fazer um dos filmes mais simbólicos e poéticos do ano de 2023. Sendo um lindo ensaio sobre como a vida e o cinema estão intricadamente conectados, além de conseguir fazer espectadores se emocionarem por uma felicidade que é difícil até mesmo de explicar e aceitar que ainda exista: O encanto da vida, como ela é.
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