A interseção entre arte e ciência se faz cada vez mais necessária no cenário atual de fake news e tentativas de descrédito. E “Enquanto Borbulha” é um daqueles espetáculos que chega na hora certa, buscando diálogo com as crianças, que são a base para a construção de uma sociedade. O texto transcende o lúdico com maestria, associando o fazer científico com os afetos e motivações que nos levam a explorar, questionar e buscar respostas para nossas dúvidas.
Leia mais: Crítica: Flashback Experience – O Musical
O espetáculo começa acertadamente com a pergunta que habita a mente das crianças há gerações: quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha? É o momento de muitas risadas com a performance de Miwa Yanagisawa, interpretando a galinha que parece querer a mesma resposta que os pequenos. Em seguida entram em cena o que parecem ser duas moléculas – Laura Samy e Bruno Duarte – disputando seu lugar no mundo num agitado bailado.
E chega o momento em que a peça joga luz nas ditas ciências hard. O trio de atores a bordo de uma bancada desenvolve o texto em tom de conversa, enquanto situam suas inquietações e perguntas em experimentos químicos e explicações sobre alguns fenômenos da natureza. Inclusive ficam atentos às interrupções dos pequenos e interagem brevemente, sem quebrar o ritmo. A proposta é interessante justamente por romper o mito da neutralidade científica, onde o cientista é indissociável da pessoa que é e do mundo em que vive.
O elenco desenvolve com maestria a proposta inovadora da peça, que é tratar o conhecimento científico como algo sempre em movimento e que está diluído no nosso cotidiano e em nós. O movimento está lá mesmo em momentos mais reflexivos e emocionantes, como na bela reflexão filosófica sobre solidão e o lugar de cada um no mundo. Os elementos cenográficos e figurinos são bem elaborados para a proposta e acompanham essa fluidez em cena.
A direção de Laura Samy e Miwa Yanagisawa (diretora assistente) acerta principalmente por fazer um espetáculo dinâmico, apostando em transições blackout enquanto os atores concluem a atuação. Ao ouvirmos apenas as vozes dos atores, mesmo que por momentos breves, aumenta a curiosidade sobre o que está por vir em cena. Além disso, a direção está bem alinhada com a proposta pouco óbvia do texto. Diante de tanta qualidade, a única coisa que os espectadores talvez reclamem é que ela dura pouco. Quando acaba fica aquela vontade de quero mais, o que também é bom e significa que não é um espetáculo cansativo.
O ato final é mais um acerto. Ele expande o conceito de ciência para além dos laboratórios e experimentos. Através de arqueólogos trabalhando em escavações, são reveladas histórias, origens e mitos que têm tanto a contar sobre o que é a humanidade quanto pesquisas e métodos de investigação. Essas histórias vão desde a Segunda Guerra Mundial, passando pelo folclore brasileiro e a mitologia afro-brasileira, bem representadas nos figurinos dos três atores. No fim do espetáculo, fica a certeza de que “Enquanto Borbulha” é o teatro brasileiro vivo, em sua máxima potência.
Quer estar por dentro do que acontece no mundo do entretenimento? Então, faça parte do nosso CANAL OFICIAL DO WHATSAPP e receba novidades todos os dias.
Oi Amanda! Muito bom ouvir suas palavras e o seu entusiasmo com o espetáculo…obrigada pela escuta e pela escrita! Beijo grande
Nós que agradecemos pelo belíssimo espetáculo!