“Nenhum horror do mundo se compara ao terror de uma página em branco.”
A jovem Sarah (Madison Iseman) senta-se de frente para o computador. Em poucas linhas, precisa responder: qual medo moldou sua vida? Pensa, pensa e não chega a conclusão alguma. Candidata ao curso de escrita criativa da Universidade de Columbia, a protagonista de “Goosebumps 2 – Halloween Assombrado” (Goosebumps 2 – Haunted Halloween, 2018) experimenta, talvez pela primeira vez, um cruel bloqueio. A frustração interrompe-se com a chegada de Tyler (Bryce Cass). Com batatinhas e energético, ele tenta estimular a namorada. O que lhe falta, contudo, não é disposição, mas tão somente experiências.
De uma vivência confortável, Sarah migra, então, para um lugar de incertezas. Elemento de catálise, o medo da página em branco desperta temores maiores. O fracasso no vestibular, a traição do namorado, as dificuldades financeiras da família: tudo isso converte-se, na imaginação infantojuvenil, em verdadeiros monstros. Como o Frankenstein de Mary Shelley ou as balinhas Gummy Bear do filme, pequenos fragmentos produzem uma criatura ameaçadora.
Em paralelo ao drama da irmã mais velha, Sonny (Jeremy Ray Taylor) tenta ajudar com a casa. Ideia do amigo Sam (Caleel Harris), o serviço de despejo da dupla encontra o primeiro cliente. Quando chegam ao destino informado, os meninos se deparam com um abandonado casarão. Escondido como tesouro em um baú, um livro empoeirado espera o manuseio das crianças. É “Halloween Assombrado”, manuscrito inacabado da série “Goosebumps”, de R. L. Stine. Essa informação, no entanto, os garotos desconhecem.
Incompleta como a redação da irmã, a obra, uma vez aberta, libera as angústias de seu autor. É simbólica, nesse sentido, a aparição de Slappy. Ventríloquo, o boneco não poderia falar senão pela voz de outrem. Ainda que, ludicamente, ele ganhe vida no roteiro de Rob Lieber (“Pedro Coelho”), pode-se supor, portanto, a figura de um marionetista. Stine ou Sarah, pouco importa, quem “manuseia” Slappy realiza, imaginativamente, o impossível no mundo real. A arte da escrita obedece, assim, à lógica da transferência freudiana. Porque não terminado, o manuscrito de Stine convoca Sarah a preenchê-lo. E, realizando tal tarefa, a protagonista pode, finalmente, libertar-se de seus temores: seja, literalmente, terminando a redação, seja, figurativamente, derrubando o namorado e salvando a mãe.
A ideia de uma obra inacabada é, ainda, uma homenagem a R. L. Stine, vivido no longa-metragem por Jack Black (“Escola de Rock”). Como todo bom escritor, o “Stephen King da literatura infantojuvenil” rejeita significados prontos. Deixa, de outro modo, tanto suas personagens quanto seus leitores falarem por conta própria. Exemplo disso, Slappy afirma na cena final: “Escrevi minha própria história na sua ausência”.
Nessa lógica, Stine ficcional e Stine verdadeiro fundem-se na direção de Ari Sandel (“Duff – Você Conhece, Tem ou É”). Em outras palavras, coexistem no filme o mal-humorado escritor da fictícia cidade Wardenclyffe e o consagrado autor da série “Goosebumps”, cujas personagens inspiram máscaras no supermercado. Não só elementos visuais, entretanto, referenciam a obra de Robert Lawrence Stine. O vizinho Sr. Chu, interpretado pelo engraçadíssimo Ken Jeong (“Se Beber Não Case”), não esconde sua admiração. Ao contrário, coloca em pé de igualdade o exemplar de “Frankenstein” e obras como “Sangue de Monstro” (Monster Blood, 1992), “O Espantalho Anda à Meia-Noite” (The Scarecrow Walks at Midnight, 1994) e “Sorria e Morra” (Say Cheese and Die!, 1992).
Uma grata surpresa, por fim, “Goosebumps 2 – Halloween Assombrado” funciona não só como uma sincera homenagem a Stine, mas também como uma interlocução entre o autor e seu público. “Escreva o que você sabe”, sugere a personagem de Jack Black à de Madison Iseman (“Jumanji – Bem-Vindo à Selva”). Mais que mera proposta para vencer o bloqueio criativo, trata-se, nesse contexto, de uma afirmação da experiência da protagonista – e por que não do espectador?
* O filme estreou ontem, dia 12, quinta-feira.
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