Todos achavam que após o término da segunda guerra mundial as fronteiras iriam cair e as pessoas viveriam em harmonia, extinguindo as suas diferenças ideológicas. Afinal, o conflito foi prejudicial para todos que participaram. No entanto, o que se viu foi uma divisão ainda maior: ocidente, oriente, capitalismo, comunismo e muros fronteiriços. É nesse cenário de divisão que surge o relacionamento entre um homem e uma mulher em “Guerra Fria” do polonês Pawel Pawlikowski.
Zula (Joanna Kulig) é uma camponesa que tem o talento do canto. Ela é uma das selecionadas para fazer parte de uma nova companhia que irá montar peças voltadas às músicas típicas do campo. Wiktor (Thomasz Kot), maestro responsável pela seleção dos membros do grupo e pela regência dos espetáculos, fica encantado com Zula assim que a vê durante os testes de escolha dos cantores. Primeiramente, o que mais chama a sua atenção é o estilo de canto fora dos padrões da garota. Apenas depois, com o tempo de convivência durante os ensaios, que o amor surge intensamente.
O obstáculo no caminho dos dois é a interferência que as forças comunistas começam a ter na Polônia. A União Soviética é exaltada e, aproveitando o sucesso do grupo de canto, é solicitado aos responsáveis que troquem as musicas do campo por hinos de cunho político para agradar o partido. Wiktor não aceita essa interferência e sugere a Zula que fujam do país, já que naquela época não era possível sair pela porta da frente e abandonar o regime. Também, se forem pegos fugindo, podem ser presos por traição. Zula não foge por medo e por gostar do seu trabalho, deixando seu amante ir embora. A partir daí, mesmo casados ou namorando outras pessoas, eles se encontram em vários locais, ficando mais tempo juntos quando Wiktor está em Paris. Ela se acostuma com a ideologia comunista e passa a renegar os trabalhos que faz com ele no ocidente. Para ela não passam de burgueses sem alma.
A guerra fria do titulo sugere a batalha entre a paixão que um sente pelo outro e suas respectivas realidades politicas. Ele é um traidor, ela vira uma estrela da música, porém não conseguem ficar unidos como um casal com as fronteiras forçando a sua separação. Pawlikowski escolhe uma razão de aspecto reduzida para diminuir os espaços das bordas e limitar o horizonte dos personagens, que se envolvem na solidão com planos sem profundidade de campo. O preto e branco da fotografia reforça a melancolia de uma história que quase não possui momentos felizes e expõe a atmosfera de uma Europa ainda nas trevas depois de uma barbárie. A única coisa que parece uni-los é a musica presente em todas as cenas, seja no piano que ele toca ou na canção que ela canta. Musicas que suspendem a urgência de transformação social tão necessária naquele momento, mas que atrapalha o casal de fazer o que eles mais gostam: se amar. Chega um momento que não há para onde fugir, o que resta é se entregar, seja um para o outro ou para os seus perseguidores.
Essa crítica faz parte da cobertura da 42ª Mostra de Cinema de São Paulo
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