Quando se fala em Adam Sandler, logo vem à mente comédias histéricas e produções B, mas poucos reconhecem que o ator consegue, na medida do possível, fazer filmes dramáticos, como em “Embriagado de Amor” e agora com “Joias Brutas”. Na obra de Josh Safdie e Ben Safdie, ele constrói um personagem que gera no espectador um misto de repulsa e pena, e que poderia muito bem ter proporcionado ao ator uma indicação ao Oscar em 2020. Talvez, os próprios membros da academia de cinema norte americana desmereçam Sandler por causa de seus papeis bobocas do passado, que permeiam sua trajetória aos montes.
Nesta nova produção da Netflix, ele é Howard Ratner, um judeu apostador inveterado e negociante de joias de Nova York, que espera a chegada de uma valiosa gema bruta vinda da África. Com o lucro que vai conseguir em um leilão, ele espera pagar os inúmeros credores que não param de bater à sua porta. O problema é que o astro de basquete Kevin Garnett (o filme se passa em 2012), em visita à loja de Howard, se apaixona pela pedra e a toma emprestada. O jogador vê nela algo místico, que pode ajudá-lo nos jogos. A partir daí, a jornada do Judeu para recuperá-la será caótica. Em meio a isso, ainda há os conflitos com ex-esposa Dinah (Idina Menzel, fazendo mais do mesmo) e o romance com a bela Julia (Julia Fox, precisa de mais treinamento de atuação).
Como em “Bom Comportamento” os irmãos Safdie carregam de tensão a narrativa, e tornam a vida de seu protagonista um inferno. Está certo que ele não é um homem fácil, já que nunca aceita sair perdendo em um negócio e sempre se envolve em discussões. É neste ponto que a atuação de Sandler é importante para unir o patético ao repulsivo, principalmente quando Howard maltrata pessoas ou é constantemente insultado e agredido. O bom trabalho do ator é evidente porque consegue, pela forma atrapalhada de andar e pela dicção fora do comum, criar uma espécie de mafioso de quinta categoria. Aquele que suja as mãos em negócios nas ruas.
Claro que a ajuda do figurino de Miyako Bellizzi, e suas roupas e joias espalhafatosas, e a direção e roteiro dos Safdie (escrito com a ajuda de Ronald Bronstein) é de grande ajuda para essa construção. Os cineastas, para ser mais exato, traçam um caminho de criação e destruição a partir da extração da gema em uma mina na Etiópia, até a Nova York, para onde ela é exportada. A câmera entra nela assim que os mineiros a retiram da rocha, para depois sair pelo monitor de um exame de colonoscopia que Howard faz em um hospital. Homem e pedra são unidos por essa sequência, e o caos se instala, só sendo mitigado em um momento similar no terceiro ato.
Contudo, antes da calmaria, a tempestade se amplifica a tal ponto que é difícil não ficar tenso com os rumos da trama. Como em um eficiente thriller, “Joias Brutas” é potente até o último frame e, quando o espectador consegue voltar a respirar, dá para analisá-lo como uma história que fala da ganância vinda de uma pressão capitalista que não permite que as pessoas pensem em mais nada além do dinheiro. Outro fator (mais espinhoso) que pode ser levado em consideração é uma suposta crítica aos judeus, já que o roteiro os mostra como negociantes inescrupulosos e sedentos por lucros, além de, em alguns momentos, como míseros ladrões. Os irmãos Safdie, como judeus, podem ter aberto uma discussão sobre as atitudes de parte de um povo que foi massacrado durante a segunda guerra mundial e que hoje toma atitudes espúrias em prol de riquezas. Talvez, assim como Kevin Garnett,os cineastas achem que e a gema possui poderes místicos, mas só para os africanos, que pagam com suas vidas por a possuírem em suas terras.
Imagens e Vídeo: Divulgação/Netflix
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