A certa altura de “Meu Nome É Sara”, a protagonista de mesmo nome (Zuzanna Surowy) é convocada pelos filhos do casal que a acolheu para uma partida de esconde-esconde. Apesar da aparente banalidade do momento, a brincadeira escolhida pelas crianças é uma definição perfeita da vida a que Sara, uma judia em plena Segunda Guerra Mundial, se vê obrigada a assumir após a ocupação de sua cidade-natal pelos nazistas alemães. A fim de sobreviver ao extermínio de seus semelhantes, a jovem adota a alcunha de Mania Romanchuk e aprende nos mínimos detalhes os rituais e rezas do cristianismo ortodoxo, a fim de esconder completamente a sua origem judaica, inclusive do casal de agricultores que a acolhe (mesmo que sob muitas suspeitas).
Dessa forma, percebe-se em “Meu Nome É Sara” a construção de uma história potencialmente rica, que discute as maneiras como regimes autoritários fascistas obrigam as minorias a um processo de apagamento forçado e como, em contrapartida, sufoca qualquer tentativa de altruísmo para com esses indivíduos através de ameaças a civis que, apesar de não fazerem parte dos grupos perseguidos, também veem sua liberdade e segurança posta em xeque em prol de um projeto político-ideológico. Entretanto, apesar de indícios aqui e ali de um filme mais bem-sucedido, no geral, o longa dirigido por Steven Oritt sofre com alguns problemas que, quando acumulados, impedem o produto final de atingir todo seu potencial.
O principal empecilho para que isso aconteça é a clara falta de hábito do elenco em atuar em inglês. Apesar de entre indivíduos de mesma nacionalidade, os diálogos se desenrolaram na língua nativa das personagens, na maior parte do tempo – em que ucranianos e alemães se relacionam –, as cenas são travadas em inglês, como forma de universalizar todos essas línguas distintas. Apesar de haver momentos em que essa dificuldade é ultrapassada e os atores entregarem atuações bastante críveis e honestas, em muitos outros fica evidente a dificuldade dos intérpretes em articular de forma bem-sucedida em uma língua estrangeira as emoções pedidas pelo roteiro (a maioria do elenco é formada por poloneses). Essa questão ao longo do tempo se torna algo inescapável, frequentemente dificultando a conexão entre espectador e personagens, uma vez que se torna difícil acreditar naquelas pessoas retratadas pelo longa.
Outro problema é a rapidez com que o filme – e por tabela, o roteiro de David Himmelstein – desenrola os primeiro e terceiro atos da trama. Por um lado, todo o percurso de Sara até chegar à casa de Nadya e Pavlo (Michalina Olszanska e Eryk Lubos, respectivamente) acontece, basicamente, nos primeiros dez minutos de projeção, mostrando pouco da conexão dela com o irmão (com quem ela saiu fugida da cidade de Korets). Por outro, a narrativa do filme também se resolve em pouquíssimo tempo, o que acaba de certa forma, senão menosprezando, pelo menos não dando a devida importância aos laços criados entre Sara e a família camponesa que a acolheu.
Todavia, há elementos que mantém “Meu Nome É Sara” minimamente assistível ao longo de seus 111 minutos, em especial o cuidado que o roteiro tem em criar nuances ao trio principal. Sara, ao mesmo tempo em que toma todos os cuidados para manter sua identidade judaica muito bem escondida, também começa a criar um sentimento de resistência à medida que vivencia as atrocidades cometidas pelos nazistas na pequena cidade ucraniana em que vive, percebendo na militância a única forma de manter a sua tradição viva. Nadya, por sua vez, é inicialmente pintada como vilã, aquela que desconfia da protagonista a qualquer custo e que não teria o menor pudor em dedurá-la caso descobrisse a sua verdadeira origem. Entretanto, com o passar do tempo, ela e Sara criam uma relutante cumplicidade feminina e muitas de suas atitudes se tornam compreensíveis graças a uma proteção incondicional a seus filhos. Por fim, Pavlo, enquanto cria um interesse sexual por Sara, de apenas 14 anos (não coincidentemente ele se casou com Nadya quando ela tinha 15), e apresenta comportamentos tóxicos para com sua esposa, também condena veementemente o estupro cometido pelo irmão a uma judia fugitiva.
No final das contas, “Meu Nome É Sara” não é nem de longe um grande filme, apesar de ter o potencial de sê-lo. Mesmo assim, a competência técnica e o eventual insight sobre a vida em constante vigilância e perigo fazem do filme uma obra minimamente envolvente, se dificilmente memorável.
Imagens e vídeo: Divulgação/A2 Filmes
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