Um cinema de contemplação recheado de planos, sequência, diálogos e mais diálogos
Pode ser considerado arriscado começar falando sobre uma impressão mais geral de “Na Praia à Noite Sozinha”, já que a ideia de uma crítica/análise é fazer com que a experiência de assistir o filme fique mais interessante, seja ela no sentido que for. Mas, neste caso, é um pouco diferente, pois estamos diante de um filme bem diferente daqueles que abertamente se propõem a construir uma estética fora do padrão, mesmo em comparação com algumas outras produções independentes.
Young-hee (Kim Min-hee) vive em Hamburgo, na Alemanha, ela é uma atriz coreana de renome, mas após ter um caso com um homem casado exposto na mídia ela decide voltar para sua cidade natal. Essas informações estão presentes na própria sinopse do filme, e já é a partir desse ponto que as curiosidades começam. Se você for ao cinema sem estas informações, provavelmente levará alguns bons minutos para perceber qual a verdadeira relação de Young-hee com a cidade europeia e a sua volta para a Coréia do Sul.
Tratando as curiosidades agora como método narrativo proposto pelo diretor Hong Sang-soo, é apenas através do diálogo entre os personagens que podemos tentar ir descobrindo aos poucos o que se passa ali. A estrutura da narrativa e da concepção fotográfica parecem ter sido construídas uma a partir da outra, como o filme não possui nenhum corte dentro de uma cena, a fotografia de Kim Hyung-koo permanece parada, e caso haja uma movimentação dos personagens ela acompanha, mas sem nenhum corte. Até este momento nada fora do normal, estas circunstâncias estão presentes em diversos filmes desde os dirigidos pelo japonês Yasujiro Ozu lá na década de 1950. O que realmente chama a atenção no método de como a câmera age está relacionado ao zoom, assim como em um documentário, a aproximação da lente com a cena em questão é aproximada sem nenhuma preocupação estética em cima disso. Na verdade, Hong cria a sua própria estética ao usufruir deste método.
Ao primeiro olhar estas características podem deixar o espectador um pouco desconfortável, mas ao longo do primeiro e segundo ato é possível perceber os principais “cacoetes” do diretor. Ao contrário das produções consideradas de “contemplação”, onde cada plano possui muitos minutos sem nenhum movimento de câmera e nenhum diálogo, Hong pega este conceito e carrega as cenas de verdadeiros monólogos entre os personagens. Talvez esta seja o ponto alto do filme, o progresso da narrativa está diretamente ligado a forma como a direção leva a naturalidade em cada cena.
“Na Praia a Noite Sozinha” pode ser considerado um longa-metragem de 100 minutos divididos em pequenas cenas filmadas em plano sequência. Um plano com pouco mais de 10 minutos de duração mostra um longo diálogo envolvendo Young e um grupo de amigos durante um jantar, aos poucos pequenas situações vão ocorrendo para que a monotonia do plano sequência faça sentido, junto com pequenos detalhes que são importantíssimos para a construção da personagem principal. Hong Sang-soo faz este considerado “bicho de sete cabeças” no meio cinematográfico que é o plano sequência e traz ele de volta para a tela, com uma beleza única.
Estamos diante de uma produção diferente, que infelizmente não é do interesse de boa parte do público de massa, certamente ele vai fazer muita gente sair mais cedo da sala de cinema. É contraditório quando isto acontece, pois filmes simples assim se mostram tão grandiosos quando analisados de uma forma mais humana em relação aos personagens e seus conflitos cotidianos. A câmera permanece lá e nós nos tornamos parte daquele mundo, mesmo que por alguns minutos.
Por Guilherme Santos
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