Os momentos iniciais de “O Melhor Está Por Vir” estabelecem de forma muito bem-sucedida as disparidades entre os melhores amigos Arthur e Oscar (Fabrice Luchini e Patrick Bruel, respectivamente). Enquanto o primeiro tem uma transa interrompida pelo confisco de seus bens e apartamento por causa de dívidas não pagas, o segundo, num mísero percurso de carro com sua filha até o apartamento da ex-mulher, consegue ser insuportavelmente irritante ao tentar controlar a vida de todo mundo à sua volta (inclusive a de uma anônima no trânsito). Dessa forma, os diretores e co-roteiristas Alexandre de La Patellière e Matthieu Delaporte estabelecem a dinâmica que irá reger a amizade no centro do longa, como também conseguem a simpatia do espectador por duas personagens imperfeitas e que têm tudo para serem desagradáveis por causa de seus excessos.
Não à toa esse relacionamento central é definitivamente o ponto forte do filme, graças ao cuidado com que roteiro e atores têm ao construí-lo. “O Melhor Está Por Vir” poderia muito bem ter apresentado exemplarmente os protagonistas na já citada sequência de abertura para, em seguida, pouco aprofundar as personagens e mantê-las apenas nas posições de straight guy neurótico e certinho e amigo impulsivo e despreocupado. Entretanto, de La Patellière e Delaporte, ao mesmo tempo em que reiteram os comportamentos dominantes de Arthur e Oscar, também abrem o leque de possibilidades para cada figura, permitindo um rico intercâmbio entre as personagens, dando à amizade central do longa uma naturalidade digna de nota e evitando fazer da oposição entre eles a única característica notável dessa relação.
Além disso, ambos os papeis são muito bem defendidos por Luchini e Bruel, que possuem uma ótima química em cena. O trecho no restaurante em Biarritz, por exemplo, em que os amigos encenam um flerte, a fim de entender por que Arthur não consegue superar o divórcio e arranjar uma nova namorada, é um daqueles momentos que em mãos erradas poderia ter sido um desastre. Entretanto, a direção segura e o impecável timing cômico dos intérpretes fazem dessa cena um dos momentos mais divertidos e sinceros do longa, demonstrando através do chiste a intimidade compartilhada por esses dois sujeitos.
Outro ponto positivo de “O Melhor Está Por Vir” é o bom tratamento que a obra faz da temática do câncer. Em resumo, a trama gira em torno do fato de Arthur descobrir, por engano, que Oscar tem uma metástase e possui apenas seis meses de vida. Todavia, quando ele tenta dar a má notícia para o amigo, ele se enrola e acaba dando a entender que é ele quem está em estado terminal. Nisso, Oscar decide fazer dos supostos últimos meses de vida de Arthur uma missão para realizar todos os seus maiores desejos e cumprir suas pendências mais sérias, sem saber que, na verdade, quem está morrendo é ele.
Logo, em teoria, “O Melhor Está Por Vir” tinha tudo para dar errado. Por um lado, ao escolher a comicidade como forma de tratar sobre o assunto, corre-se o risco de fazer pouco caso de uma situação difícil e potencialmente devastadora, não só para quem carrega o câncer, mas também para aqueles em seu círculo social. Por outro, há também sempre o perigo de se fetichizar a doença, transformando suas consequências físicas e psicológicas em mero alimento para um melodrama barato e insensível. Ao focar o seu humor mais nos hábitos e manias das personagens, e seu drama no desenvolvimento psicológico dos protagonistas, o filme de de La Patellière e Delaporte consegue ser uma obra em que o câncer está no centro da narrativa, mas não a domina.
Apesar de não ser um filme hilariante e sofrer de problemas de ritmo – desnecessariamente se estendendo a quase duas horas de projeção –, “O Melhor Está Por Vir”, no todo, é uma simpática e inofensiva comédia sobre uma amizade que, por acaso, é acometida por uma doença.
Imagens e vídeo: Divulgação/Paris Filmes
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