O que seria dos cinéfilos sem o cinema independente? O transbordo de filmes comerciais cansam qualquer cérebro que está disposto a pensar um pouco mais do que o normal. Produções como “Três Anúncios Para um Crime” fogem do formato comercial e pisam em terrenos fora do comum para quem está acostumado com o filão hollywoodiano. Com uma produção modesta e um roteiro cheio de camadas, o cineasta Martin McDonagh constrói sua narrativa que gera uma certa estranheza de início, mas que toma forma e mostra suas intenções durante a projeção.
A premissa já é interessante por si só ao mostrar Mildred Hayes (Frances McDormand), uma mulher forte, mas totalmente amarga, que compra o espaço em três outdoors na entrada da cidade de onde mora para anunciar frases que cobram da polícia a resolução do caso do estupro e assassinato de sua filha. O xerife vivido por Woody Harrelson ganha destaque em uma das frases porque comanda uma delegacia cheia de policiais pateticamente incompetentes. São todos desprovidos de inteligência, dificultando, evidentemente, na investigação de qualquer crime. O principal deles é o oficial Jason Dixon (Sam Rockwell) com seu racismo e violência acima da média para qualquer agente da lei dos EUA.
O humor negro é essencial para que os atos muitas vezes hediondos sejam justificados para os espectadores. Fica clara a influência dos irmãos Coen neste quesito. A cidade pequena, o sotaque característico de seus habitantes e todo o contexto da história lembram em muitas vezes o clássico moderno “Fargo”. O ódio que as pessoas da Ebbing, Missouri carregam deixa o clima tenso, principalmente quando os Outdoors viram notícia na televisão. Mildred Hayes é a síntese desse ódio, que está dentro dela e a sua volta, já que as pessoas da cidade passam a vê-la como uma espécie de vilã. “Três Anúncios Para um Crime” é cadenciado e por isso, seus diálogos são importantes para que a trama se desenrole de forma competente. Outro fator agregador é a fotografia de Bem Davis, que externa as condições dos personagens em penumbras e mantem sua câmera sempre perto das emoções. Planos gerais servem como transições ou para mostrar a melancolia de uma cidade no meio do nada.
O elenco escolhido por Martin McDonagh é, junto com o roteiro, o grande destaque, o que não é uma surpresa, pois conta com nomes de peso e que é encabeçado pela maravilhosa Frances McDormand. A atriz, que havia dado um tempo aos grandes papeis, é uma explosão de emoções e fúria. Ela parece estar no limite de suas faculdades mentais e seu sarcasmo é recorrente. A dor que essa mulher sente é palpável e vemos em seu rosto enrugado as marcas que ela deixou. Marcas do passado, com um marido violento, e depois com a morte da filha. Suas ações são muitas vezes discutíveis, mas o filme não os julga, apenas mostra suas consequências. A indicação ao Oscar para McDormand é praticamente certa e será uma grande injustiça se ela não vir. Outro que merece ser lembrado pela academia é Sam Rockwell. O seu desempenho acarreta sentimentos diversos. Se coramos com seu comportamento patético e muitas vezes engraçado, também nos indignamos por sua falta de comprometimento e seus atos preconceituosos e violentos. Essa dualidade é difícil de conseguir em termos de atuação e aí está a aparente competência do intérprete.
Os personagens são grandes mulas para o sentimento de raiva, e a superação dela é o grande tema do filme. Como não senti-la depois da morte brutal de uma filha? Com a incompetência da polícia? Ou mesmo com o simples comportamento de um membro da família? São questões levantadas e não respondidas, deixando ao espectador a função de imaginar o que acontece depois dos créditos finais.
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