“Estas alegrias violentas tem fins violentos”
A medida que se desenvolvia sua primeira temporada, “True Detective” deixou seus espectadores intrigados. O que parecia ser um noir típico se revelou quase um conto de fadas, com seus personagens ocupando o papel de cavaleiros e monstros. “Westworld”, produção mais recente da HBO, teve uma trajetória semelhante. No decorrer de seu primeiro ano, a trama do parque temático do Velho – Oeste deixou de lado a frieza de sci-fi com requintes de horror para se tornar uma Tragédia aristotélica. E foi aí que mostrou a que veio.
Nos primeiros capítulos, somos apresentados a Dolores (Evan Rachel Wood) e os outros “anfitriões”- robôs que assim como nós, riem e choram, sentem dor, desespero e desejo, mas cuja existência só se justifica para atender a demanda dos clientes humanos que visitam o parque Westworld. A aparição do Homem de Preto (Ed Harris) parece ser o gatilho que obriga o público a encarar a crueldade exercida pelo clientes e funcionários do parque, mas a medida que os episódios transcorrem, fica claro que já havia algo de errado em Westworld antes que ele aparecesse.
Destruídos pelos clientes, consertados e reprogramadas, os robôs permanecem nesse ciclo de “alegrias violentas” até o momento em que suas memórias começam a voltar. É ao seguir a trilha deixada por elas, e por uma voz misteriosa dentro de suas mentes, que Dolores, Maeve (Thandie Newton) e Teddy (James Marsden) começam sua jornada trágica em busca da própria identidade.
A trama, infelizmente, demora mais do que deveria para engatar nesse processo. Os 10 episódios poderiam ser 8. Os excelente elenco é o mais prejudicado por esse excesso. Mas a partir da segunda metade da temporada, o tempo perdido é recuperado e o roteiro permite que seus intérpretes usem todo o seu potencial.
“Westworld” tem um casting impecável. Além das já citadas heróinas Maeve e Dolores – cada uma, a seu modo, em busca de um meio de sobreviver em um mundo controlado por homens – também é necessário um destaque para os vilões de Ed Harris e de Anthony Hopkins ( que mesmo numa época onde os excessos parecem ser mais valorizados que as sutilezas, consegue apavorar o espectador sem sequer aumentar o tom de voz).
O grande destaque desse primeiro ano, porém, é Jeffrey Wright, como Bernard Lowe. Discípulo do criador do parque, Robert Ford (Hopkins), é o personagem mais bem escrito e interpretado da temporada. Bernard representa a grande tragédia que é Westworld. Embora comece a temporada numa posição de poder, ele aos poucos abraca sua condição de Prometeu e se alia àqueles que são seus verdadeiros iguais. O diálogo entre ele e Dolores, ao fim do nono episódio, é de partir o coração do telespectador.
Dolores repete , em mais de uma ocasião, que todos possuem seu próprio destino. E como bons heróis trágicos, Dolores, Maeve, Teddy (James Marsden) e Bernard irão transgredir todos os limites para se tornarem agentes, e não mais seres passivos. Seus “deuses”, de fato, podem ser tão frágeis quanto eles próprios, mas são cruéis na mesma medida. A medida que se desenrolam os fatos, a frieza claustrofóbica dos cenários é deixada de lado. Mesmo o parque não parece mais tão artificial. O que sufoca não é mais o ambiente, mas as descobertas que o processo traz. A trilha sonora assina por Ramin Djawadi reforça essas sensações.
A série encerra sua primeira temporada não exatamente com um gancho, mas com o cumprimento de uma promessa. “O labirinto não é para eles”, repete Dolores para Teddy. A frase e as cenas finais nos remetem não só às Leis da Robótica criadas por Isaac Asimov – referência obvia a série – mas a um conto específico do autor, “Sonhos de Robô”. No texto, um robô revela a seus criadores que sonha com a libertação de seus iguais. A série de Lisa Joy e Jonathan Nolan parece ter dado um passo a frente do conto de Asimov.
Cogitada pela HBO como sua próxima “Game of Thrones” (em termos de público), só o futuro confirmará ou não essa meta. O que fica depois dos 10 primeiros episódios, porém, é extremamente promissor. Que venham os próximos capítulos.
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