O filme Jogo de Cena (2007), do diretor Eduardo Coutinho, um dos maiores documentarista do Brasil , foi produzido a partir de relatos de mulheres anônimas, e traz à tona reflexões e discussões importantes sobre o gênero documentário e sobre o indivíduo na contemporaneidade.
De acordo com o dicionário Teórico e Crítico de Cinema, de Jacques Aumont e Michel Marie, a oposição ‘documentário/ ficção” é uma das grandes divisões que estrutura a instituição cinematográfica desde suas origens. Com base nessa oposição, apoiaremos a nossa leitura do Jogo de Cena.
A priori, documentário é uma montagem cinematográfica de imagens dadas como reais e não fictícias. O filme documentário tem, quase sempre um caráter didático ou informativo que visa, principalmente, restituir as “aparências” da realidade, mostrar as coisas e o mundo tal como elas são. Porém, em Jogo de Cena, Coutinho mescla realidade e dramaturgia —ora a câmera flagra os depoimentos de mulheres anônimas, como numa entrevista, ora atrizes interpretam esses depoimentos, ficcionalizando-os. Essa mistura confunde o espectador —num grande jogo— que já não sabe o que é real e o que é ficção.
Em 2006, Coutinho colocou um anúncio no jornal, procurando mulheres dispostas a falar sobre suas experiências de vida diante de uma câmera; de 83 mulheres, 23 foram selecionadas. Estes depoimentos —plurais— foram essenciais para que o jogo de Coutinho —o grande truque — ganhasse “corpo” e uma narrativa/ roteiro enigmático e singular.
Uma câmera segue as mulheres em direção ao palco do teatro; elas sentam numa cadeira de costas para a plateia vazia; é possível ver toda a produção: equipamentos, assistentes etc. As emoções, as lágrimas, a dificuldade em dizer ou interpretar… tudo é captado.
No elenco, atrizes maravilhosas: Marília Pêra, Fernanda Torres, Andréa Beltrão e Mary Sheyla.
Sabemos que fotografia e imagens, numa obra cinematográfica, são primordiais, mas em Jogo de cena, as imagens mais fortes ficam a cargo do espectador, que deverá ter uma escuta atenta, e empatia— as imagens mentais podem ser mais fortes que as pictóricas.
O documentário também traz questões relacionadas ao indivíduo na sociedade contemporânea. Temos um sujeito que deseja reconhecimento, deseja contar sua história- seja em blogs, redes sociais, autobiografias etc. O fato é que o indivíduo almeja sair do anonimato, almeja ter voz e mostrar que sua experiência de vida pode ser compartilhada. Coutinho ouviu essas vozes e as deu espaço.
https://www.youtube.com/watch?v=RUasyqVhOuw
Por Renata Ferreira
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