Que surpresas mais esse 2016 ainda nos reserva? Tantos artistas queridos nos deixaram nesse ano, mas, ainda assim, tiro algo de bom disso tudo: tenho certeza que o céu esta brilhando um pouco mais com essas estrelinhas que para lá se mudaram e certamente teremos noites mais transbordantes de poesia daqui pra frente. Nascido em 10 de Setembro de 1930 esse Maranhense teve uma vida bastante agitada começando a escrever seus poemas por volta de 1943. Com 18 anos tem seu soneto “O Trabalho” publicado no jornal “O Combate”. Escritor, poeta, crítico de arte, biógrafo, tradutor, memorialista e ensaísta brasileiro e um dos fundadores do neoconcretismo esse artista tomou seu lugar na Academia Brasileira de Letras apenas em 2014.
Inquieto e polêmico foi militante à época da ditadura e por isso exilado. Durante esse período escreveu a obra “Poema Sujo”, que inspirou a série documental “Há Muitas Noites na Noite” exibida entre dezembro de 2015 e Janeiro de 2016 pela TV Brasil. Vencedor de muitos prêmios e indicado a tantos outros esse gigante da literatura brasileira se despede da Terra aos 86 anos para fazer poesia em outras bandas, mas nos deixa o legado de uma vida inteira dedicada à arte da escrita e muitas saudades.
Deixo aqui um pouquinho de sua poesia:
Cantiga para não morrer
Quando você for se embora,
moça branca como a neve,
me leve.
Se acaso você não possa
me carregar pela mão,
menina branca de neve,
me leve no coração.
Se no coração não possa
por acaso me levar,
moça de sonho e de neve,
me leve no seu lembrar.
E se aí também não possa
por tanta coisa que leve
já viva em seu pensamento,
menina branca de neve,
me leve no esquecimento.
Traduzir-se
Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.
Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.
Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.
Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.
Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.
Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.
Traduzir-se uma parte
na outra parte
– que é uma questão
de vida ou morte –
será arte?
Os mortos
os mortos vêem o mundo
pelos olhos dos vivos
eventualmente ouvem,
com nossos ouvidos,
certas sinfonias
algum bater de portas,
ventanias
Ausentes
de corpo e alma
misturam o seu ao nosso riso
se de fato
quando vivos
acharam a mesma graça
Não há vagas
O preço do feijão
não cabe no poema. O preço
do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão
O funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos.
Como não cabe no poema
o operário
que esmerila seu dia de aço
e carvão
nas oficinas escuras
– porque o poema, senhores,
está fechado:
“não há vagas”
Só cabe no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço
O poema, senhores,
não fede
nem cheira
https://youtu.be/6LG0utmIR9A
Quer estar por dentro do que acontece no mundo do entretenimento? Então, faça parte do nosso CANAL OFICIAL DO WHATSAPP e receba novidades todos os dias.