Os fãs de Sci-Fi têm, entre suas obras favoritas, alguns nomes consagrados como Isaac Asimov, Philip K. Dick, William Gibson e Moebius. Pois este naipe de mestres da ficção científica são justamente as referências do pernambucano Watson Portela. Premiado em 2015 com o Troféu HQ Mix de Grande Mestre dos Quadrinhos, Watson desenvolveu um estilo único onde consegue retratar tramas com alta carga humanista ambientadas em cenários futuristas.
Seus primeiros quadrinhos foram publicados em revistas da Grafipar e Press em meados dos anos 1980, época em que estavam aportando aqui referências como a Heavy Metal e sua versão europeia, Metal Hurlant. Foi nesse contexto que publicou na Inter Quadrinhos sua famosa série “Voo Livre”. Ainda seguindo essa tendência Watson teve sua revista própria, intitulada Paralelas. Bem mais tarde, já no ano 2000, algumas histórias de Paralelas foram republicadas em dois álbuns pela Opera Graphica. E finalmente a maioria desse trabalho foi reunido em um belo álbum publicado pela Devir em 2015.
Em Paralelas podemos ver um domínio seguro da narrativa sequencial, onde Watson utiliza recursos metalinguísticos bastante criativos. Muitas das histórias são apenas narradas nos recordatórios em tom quase filosófico enquanto a ação corre solta nos quadrinhos. Essa dissonância chega a incomodar no início da leitura, mas a proposta é justamente essa: transmitir aquela realidade perturbadora da forma mais tocante possível.
Não bastasse o uso desse recurso inusitado, o autor vai além, brincando com os elementos narrativos das HQs, seja invertendo a ordem de páginas, utilizando balões de fala vazios ou com textos surreais, conversando diretamente com o leitor ou mesmo alterando a estética de personagens. As histórias são repletas de referências verbais e visuais da cultura pop da década de 1980. Quem viveu aquela época terá boas doses de saudosismo e quem não estava lá poderá ter uma boa aula de história cultural.
O contexto histórico também reflete de maneira interessante nas HQs. A inserção de elementos puramente brasileiros nos cenários cyberpunk soa estranha no início, mas como é muito bem planejado, consegue fluir de maneira natural. Situado em uma época pós ditadura militar, a revista se posiciona com Ficção e Erotismo, mas na realidade vai muito além. Esse erotismo se transforma quase que em sexploitation devido à violência da ambientação apocalíptica e da estética cyberpunk.
Primordialmente o traço de Watson Portela carrega uma influência indiscutível de Moebius. Já em algumas histórias mais bem elaboradas visualmente, podemos notar um estilo que lembra muito as figuras femininas de Milo Manara. Com menos frequência, mas ainda presente, é possível identificar referências do mangá e dos quadrinhos europeus, sobretudo “Tintin”, de Hergé. Portela é muito versátil em seus traços e, independente da referência visual, os cenários são sempre muito ricos e complexos.
Seja qual for a edição de Paralelas que você consiga, todas são compostas de diversas HQs curtas e fechadas. Normalmente não há continuidade nem relação entre essas histórias. O álbum da Devir é muito fácil de ser encontrado em livrarias especializadas e gibiterias. Os dois volumes da Opera Graphica também se encontram disponíveis no Mercado Livre e em sebos reunidos no Estante Virtual. Se você não conhece ainda esse grande mestre das HQs nacionais, está perdendo!
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