Alteração no roteiro chamou a atenção de internautas, mesmo os não especialistas em Direito
Assim que estreou, elogiamos a condução de “Vale Tudo” sob comando de Manuela Dias — porém, de lá para cá, conforme esperado, as pequenas rachaduras foram ficando cada mais visíveis. Escrever uma novela é difícil: são seis capítulos por semana, e mesmo para um remake é preciso fazer mudanças, afinal, o Brasil mudou de lá para cá, e certas coisas que eram normais hoje não passam batidas sem estranhamento.
Mas não é disso que estamos falando. A novidade da vez fica por conta da trama de Leonardo Roitman (Guilherme Magon), filho de Odete Roitman que sofreu um acidente e se tornou incapaz, com sequelas físicas e mentais — incluindo episódios de convulsão — e que, por vergonha da mãe, foi dado como morto, mas secretamente entregue a uma empregada sua, Nise (Teca Pereira), que passou a tomar conta do rapaz sem que ninguém soubesse.
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À Nise foi dada uma casa e uma pensão mensal para que ela mantivesse seu segredo a salvo de todos, inclusive do restante dos Roitman. Vale lembrar que no texto original de 1988 o segredo de Odete, revelado apenas no fim da trama, é que foi ela a responsável pela morte de Leonardo, porém, encobriu de forma que sua filha Helena acreditou ser a culpada pela tragédia — o que gerou traumas tais que a personagem desenvolveu dependência do álcool.
Na versão de 2025, Nise começa a aumentar suas exigências para Odete durante primeiros capítulos de junho, argumentando que o valor da pensão é baixo, a casa precisa de reformas, e os problemas de saúde de Leonardo tem se agravado. A matriarca dos Roitman é relutante, recusa-se a ver o filho, mas concorda com as exigências desde que ela suma de sua frente.
O público então descobre que Nise está sendo orientada por sua neta, Ana Clara (Samantha Jones), que acha um absurdo essa história toda e quer chantagear Odete, quem, aliás, já paga seus estudos. As coisas escalam, e é a partir daí a sequência de rasgadas do Código Civil Brasileiro.
Ana Clara consegue com juiz de paz para casá-la com Leonardo, tornando-se sua herdeira, e quer. O público não demorou para perceber as incongruências do roteiro: I – Leonardo não tem a menor condição de manifestar sua própria vontade, e precisaria da validação de, enquanto maior de idade, um curador — no caso, Odete, enquanto mãe, estaria habilitada para, no entanto: II, – Leonardo, para todos os efeitos, está dado como morto; III – ainda que feito com “suborno de juiz”, um casamento é um processo burocrático e exige testemunhas para ser válido; e, para fechar, IV – bens de herança não se transmitem como herança ao cônjuge.
Sem entrar em pormenores legais, o argumento da autora se volta para a chantagem da nova vilã contra Odete — que, a essa altura (quem diria), já virou queridinha do público — afinal, ela não quer que ninguém saiba o que aconteceu de verdade com o filho. No entanto, ao mesmo tempo que Manuela Dias quer pintar a magnata como uma ricaça inescrupulosa, subestima a inteligência do público ao retratá-la em uma situação de vulnerabilidade, sem questionar a teia de absurdos — e como teria todos os meios para manter Ana Clara calada, talvez até para sempre.
Vale tudo por audiência?
As alterações no roteiro original e inserção de tramas paralelas parece estar funcionando, ou ao menos não prejudicando-a num todo no quesito audiência. De lá para cá, Vale Tudo trouxe labubu, morango do amor, bebês reborn, assexualidade, jogo do azar — indo desde pretensamente cenas cômicas e que não contribuem com o andamento da história, até beirando o desserviço, com temas sérios sendo tratados em cenas de cinco minutos e nunca mais referenciados.

Em recente entrevista, Taís Araújo trouxe os bastidores de volta ao holofote ao, em uma entrevista à Revista QUEM, comentar sua frustração com o andamento da trama, em específico sobre a reviravolta em que sua personagem, Raquel, perde tudo e volta a vender sanduíches na praia (o que não ocorria em 1988). Ela não é a única que parece descontente: João Vicente de Castro, Malu Galli, e Humberto Carrão são alguns outros que expressaram publicamente seu desconforto.
“Como mulher negra, como artista negra, tinha a esperança de ver outra narrativa sobre mulheres negras. […] Quando peguei a Raquel para fazer, falei: ‘A narrativa dessa mulher é a cara do Brasil. Ela vai ter uma ascensão social a partir do trabalho. Ela vai ascender e vai permanecer. isso vai ser uma narrativa nova do que a gente vê sobre representação da mulher negra na teledramaturgia brasileira. Quando vejo que isso não aconteceu, como uma artista que quer contar uma nova narrativa de país, e a dramaturgia proporciona isso, confesso que fico triste e frustrada.”
Taís Araújo em Entrevista à QUEM
Imagem Destacada: Divulgação/Gshow
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