Não, eu não postei nada sobre o caso dos 33 rapazes que estupraram uma jovem no Rio de Janeiro. Eu li textos de pessoas indignadas escrevendo que eram contra a cultura do estupro. Eu fiquei comovido. Mas o que não me comoveu muito em relação a toda essa barbárie foi a forma com que todos logo se prontificaram a escrever em seus murais, trocar suas fotos e ficar de luto.
Me desculpe, caro leitor, não é que eu esteja descreditando o protesto geral da nação online. Ele foi até benéfico para que ocorresse a denúncia. Por outro lado, toda essa comoção me fez refletir sobre o comportamento das pessoas na vida real. O verdadeiro não à chamada “cultura do estupro” será quando nós, homens – héteros e gays – pararmos de “coisificar” as mulheres.
Nosso olhar na rua, nosso assovio, nossos programas de televisão, nossa revista cujas capas vendem porque, bem, mulher semi-nua vende e é um produto que gostamos de assistir. Estamos estuprando as mulheres todos os dias, violentamente, de canal em canal. Precisamos mudar de botão no controle remoto.
Estamos estuprando as mulheres quando chamamos uma senhora de 68 anos de vagabunda, vadia e filha da puta, e colocamos a foto dela no tanque do carro de pernas abertas no local de abastecer. É um estupro!
Estamos estuprando mulheres quando duvidamos da capacidade da mulher de gerir uma empresa, uma escola ou um país, ou quando um diretor de teatro renomado tenta tocar indevidamente uma apresentadora de tv na frente das câmeras.
Estamos estuprando mulheres quando o maior cantor de música sertaneja do momento no Brasil tem letras como: (…) A galera tá pedindo pra tocar no paredão; As novinhas tão subindo e descendo até o chão (…)
O que dizer então de um estuprador e torturador elogiado durante um processo na câmara dos deputados por um presidenciável?
Pois bem, de repente estava aí: Todo mundo chocado com os 33 seres que se aproveitaram da menina, ao vivo e em cores, se gabando pelas redes que a “coisa” da qual eles abusaram já era assim “meio pra frente”.
O Brasil só vai mudar a cultura do estupro quando parar para refletir o quanto a vulgaridade das músicas, revistas, programas de humor é perigosa para a sociedade e empresta uma aura de normalidade à violência que “coisifica” a mulher.
Você pode gostar do funk, do hiphop, do soul… mas quando aprova a vulgaridade de certos programas e músicas e livros, pode estar ajudando a continuar a cultura do estupro, o que é realmente perigoso, afinal quem é o alvo de tanta coisa vulgar?
Amanhã esqueceremos da menina estuprada. O bandido vai lá, se redime e passa a contar testemunhos e virar homem respeitado. Essa história você já leu antes. E a mulher?
Mulher, Mulher, Mulher, Mulher, Mulher… – Já ouviu essa música?
Quando vamos parar de acreditar que princípios morais e éticos só podem ser resolvidos através de conversões religiosas? Quando vamos deixar nossa infantilidade para tratar de assuntos sérios como esse ao invés de viver para usar frases de efeito? Talvez quando refletirmos e entendermos que a cultura que tanto amamos tem sim culpa.
Repito que amanhã, voltaremos a rir da piada misógina, a assoviar para morena gostosa, assistir vinhetas de carnaval com uma mulher totalmente nua como se fosse normal. Vamos ler sobre a mulher fruta que vai ser celebridade e do cantor que usa como sobrenome um adjetivo que significa virilidade masculina, mas se fosse usado no feminino seria usado para determinar mulher puta e é daí, meu caro leitor, que vem a pergunta…
Quem é que alimenta a cultura do estupro no Brasil, senão todos os que concordam com suas práticas? Teremos todos uma parcela de culpa neste e em vários outros estupros enquanto concordarmos que a mulher brasileira é uma coisa.
#PrecisamosReverConceitos
Por: AD. Junior
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