Muito além de um blockbuster
Inspirado no conhecido romance francês, “La planète des singes”, do escritor Pierre Boulle, a saga “Planeta dos macacos” começou em 1968 com um sucesso retumbante, sendo muito bem recebido pelo público e crítica internacional. A popularidade rendeu uma série de filmes que não deu muito certo, na qual tínhamos a continuação da história original que contava sobre a queda de um astronauta em um planeta habitado por símios de extrema inteligência. “De volta ao Planeta dos Macacos”, “A fuga do Planeta dos Macacos”, “A conquista do Planeta dos Macacos” e “A batalha do Planeta dos Macacos”, marcaram as sequências e foram produzidos praticamente um atrás do outro, entre os anos de 1970 a 1973.
Mesmo não obtendo uma boa recepção, os filmes engrandeceram a saga, que contou ainda com uma série para televisão e um desenho animado que também não caíram no gosto popular, sendo cancelados rapidamente. Entretanto, a marca continuou rendendo com seus produtos e depois de quase três décadas apresentou um remake que tinha tudo para reascender a história. Dirigido por Tim Burton, a produção trazia grandes nomes do mercado e alcançou uma bilheteria considerável. Porém, isso não foi suficiente para impedir as diversas críticas negativas recebidas, o que ajudou na decisão dos estúdios em cancelar outras continuações a fim de rever o conceito de toda franquia. Uma verdadeira jogada de mestre que rendeu a oportunidade do início de uma excelente trilogia que começou dez anos depois.
“Planeta dos macacos – A origem” chegou com uma nova proposta, deixando de lado a história que já conhecíamos para aprofundar no início de tudo, o momento responsável por levar a humanidade a ser dominada por macacos. Seguido por “Planeta dos Macacos – O confronto”, somos apresentados a uma infindável guerra pela sobrevivência. Guerra essa que pode ter começado nos tiros, impulsionada pela ira e discursos políticos cada vez mais intensificados – sobre uma sociedade enraizada e sua falsa moral, mas que termina de forma interna e avassaladora em “Planeta dos Macacos – A guerra”.
Como uma poesia que dilacera a alma, somos alvejados pela graciosidade de um olhar, a dor da separação, a importância de uma amizade e uma luta constante contra os demônios internos que se destacam a cada bater do coração. Através de um enredo bem pontuado, vemos um Caesar mais família, ponderado, tentando encontrar um lugar “ao sol” para sua espécie. Todavia, sua liderança é colocada a prova e, a partir de uma traição, suas dores são expostas obrigando-o a travar uma nova batalha que vai além da humanidade. É quando, em sua jornada, ele descobre que a guerra nunca terá fim enquanto não conseguir compreender os verdadeiros motivos de sua luta.
Produzido por nomes conhecidos do mercado cinematográfico, muitos deles acostumados com grandes blockbusters, o filme encerra a trilogia com estilo, combinando um excelente trabalho de captura de movimento, com cenas de tirar o fôlego e um roteiro hipnotizante.
Escrito por Mark Bomback, um dos responsáveis pelo filme anterior, e Matt Reeves (“Deixe-me entrar”), o roteiro é um verdadeiro achado e conclui a série de filmes com muita cautela e uma estrutura dramática impecável. Sem abusar de um conflito armado, o texto é construído através de diálogos fortes, personagens significantes e um belo discurso político, psicologicamente trabalhado dentro de um contexto social bastante atual. O que oferece um ótimo equilíbrio e veracidade a uma narrativa ficcional.
Matt Reeves conduz também a direção do filme, com sensatez e uma abordagem digna de diretores mais experientes. Com uma decupagem precisa, bastante segura, Reeves explora o impacto em suas cenas – Seja esse emocional ou psicológico, sonoro ou visual – seus quadros nos permite sair do eixo, embarcando em diferente sentimentos e reflexões, ora sombrias ou esquecidas.
A fotografia de Michael Seresin flerta com uma atmosfera mais fechada, ao mesmo tempo que propõe certa esperança durante a jornada traçada por Caesar. Mesclando paletas escuras com tons mais claros e inserções de cores quentes, temos um balancear do emocional vivido por cada personagem.
O elenco é quase todo formado por atores escondidos pelo processo de captura de movimento. Contudo, nenhum deles deixa a desejar – proporcionando um belíssimo trabalho. Com destaque para Andy Serkis (o eterno Gollum de “O senhor dos anéis”), como Caesar, em uma atuação impressionante; e uma surpreendente participação do razoável Steve Zahn, interpretando o hilário “Bad Ape”. Karin konoval também está muito bem na pele de Maurice, grande conselheiro do Caesar, enquanto Woody Harrison aparece fazendo o principal personagem humano. Sua atuação, de um conturbado homem que perdeu toda família, é bastante convincente e oferece todos os gestos psicológicos necessários para uma psicopatia que nos deixa à flor da pele.
Melissa Bruning (“Parker”) e todo departamento de arte, também merecem ser lembrados pelo bom trabalho desenvolvido em toda criação do caos que se instalou ao longo dos tempos. Desde os detalhes das roupas, ao desbotar e o ferrugem do objetos e cenário, quase tudo está no lugar. A figurinista só peca em não reparar a boa qualidade de algumas vestimentas, que poderiam receber certos desgastes depois de tempos jogadas em meio ao fatídico destino da humanidade.
A trilha sonora do ótimo Michael Giacchino, mais uma vez não deixa a desejar e compõe com sabedoria o clima apoteótico da trilogia. O compasso é aumentado de acordo com crescimento e importância das cenas, casando sabiamente a dramaticidade e os momentos tensos, com a comicidade apresentada.
“Planeta dos Macacos – A guerra” é uma obra peculiar, rara de ser encontrada, principalmente se a compararmos com outros filmes do gêneros ou com blockbusters que assolam o cinema. É um dos mais belos trabalhos lançados em 2017 e uma ótima pedida para essa semana.
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