“Porque há o direito ao grito. Então eu grito.” (A hora da Estrela, p.13)
Ucraniana de nascença, mas naturalizada brasileira; Clarice Lispector veio para o Brasil com apenas dois anos de idade (e ainda bem que veio!). Foi consagrada como grande marco da nossa Literatura, e com um jeito só seu de escrever, falava para almas ao invés de falar para pessoas.
Clarice mantinha em suas obras pequenas peculiaridades que eram só dela. Autora de frases fortes e cenas inesquecíveis, era o que tínhamos de mais paradigmático na Literatura Brasileira. Em Uma Aprendizagem ou O Livro dos Prazeres, por exemplo, a narrativa se inicia como uma vírgula e termina com reticências; talvez porque nada tenha um ponto de partida e muito menos um ponto final.
E foi com essa desconstrução total, que magistralmente a Definitiva Cia. de Teatro levou para os palcos a história de Macabéa; personagem principal do seu último romance “A Hora da Estrela”.
A peça que leva nome homônimo ao livro estreou no dia 20 de janeiro no SESC Tijuca. E conta com um elenco jovem, criativo, talentoso, engraçado e cheio de vida. E “cheio de vida” é sagacidade demais, já que nossa personagem (Macabéa) tem tudo, menos isso.
Eu poderia contar todo o enredo do livro sem que isso virasse um grande spoiler, mas talvez não seja capaz de contar como ele foi colocado nos palcos sem que isso estrague as surpresas.
O livro é narrado (em terceira pessoa) por Rodrigo S.M. Sua narrativa é densa, pesada… cheia de questionamentos existenciais. Rodrigo escreve sobre a (parca) vida de Macabéa, e conta com detalhes desde de seu corpo franzino e doente, até sua má (ou quase nenhuma) alimentação. De como ela vivia em uma pensão na Rua do Acre (que como comentário pessoal, conheço bem, já que trabalho lá), das suas companheiras de quarto, de Olímpico, de Glória (“mas quem é Glória?”), e até de como ela gostava de ouvir o tic-tac da rádio relógio.
Já a peça conta com oito atores no palco (Gustavo Almeida, Jefferson Almeida, João Vitor Novaes, Livs Ataíde, Marcelo de Paula, Paula Sholl, Tamires Nascimento e Yves Baeta.). E todos eles fazem a voz e a vez de Rodrigo S.M. Todo diálogo é construído com irreverência, atitude e música. Muita música!
Tornar A Hora da Estrela em um teatro musicado, fez com que um livro triste (sensacional, mas ainda sim triste), ganhasse vida. Fez com que Macabéa “que não sabia ser”, fosse! Ali ela era alguém.
O cenário criado por Taísa Magalhães é simples. Conta com cadeiras que se movimentam ao longo das cenas e das necessidades dos atores (e veja bem, ATORES, não personagens. A não definição deles é uma das surpresas que a peça leva ao público). O chão é feito, também, para ser usado de acordo com que precisam. Além do uso de instrumentos musicais que vão desde a zabumba até a guitarra.
Outros elementos também o compõe como a máquina de escrever (clichê de um escritor), quadro (ou pequenos quadros) a giz… ai, o giz… torna a peça brincadeira de criança, contada por adultos. Quase soa como uma leitura-dramatizada, o que diferencia a peça de tantas outras que vemos por aí.
A adaptação da obra foi feita por Jefferson Almeida e Tamires Nascimento, e a direção é do próprio Jefferson. No meio da peça os atores faziam inserções, explicando como foi o processo criativo e a montagem. E ao que parece, o diretor os deixava livres para criar. E quando se junta um roteiro bom, direção boa e atores fantásticos; não tem muito como dar errado.
E aqui, se me vale a crítica (a boa crítica), creio que falta hoje em dia atores completos. A Definitiva Cia. de Teatro nos trouxe um elenco que literalmente canta, dança e sapateia. Inclusive, um dos atores estava com o braço engessado, e no lugar disso ser um problema, a maneira como tudo foi conduzido elevou a máxima de que “nada se cria, tudo se recria.”.
A Hora da Estrela fica em cartaz no SESC Tijuca até o próximo dia 19 de fevereiro, com exibições sextas, sábados e domingos. Para quem gosta de um bom teatro e uma história, vale a pena dar uma chance.
Para outras informações sobre a peça, clique aqui.
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