Uma boa história sempre pode render boas interpretações. E não por acaso a amizade de Philippe Pozzo di Borgo e Abdel Yasmin Sellou trouxe uma nova versão cinematográfica. Depois da leitura francesa no longa “Intocáveis”, chega aos cinemas “Inseparáveis” a versão Argentina dessa história inspiradora.
Felipe é um magnata que após um acidente torna-se tetraplégico. Suas lesões nas vértebras, próximas ao pescoço, fizeram com que ele preservasse somente os movimentos e a sensibilidade da região da cabeça. Um apaixonado por adrenalina se vê, de repente, dependente dos cuidados de outras pessoas. Administrar o psicológico frente a uma mudança tão drástica não poderia (mesmo) ser uma tarefa simples, fazendo de Felipe um homem amargo e triste.
Cansado de ser tratado com pena, decide então contratar um cuidador fora dos padrões: Tito, seu ex ajudante de jardineiro. Tito é um homem cuja história fala contra si: mundano, tem sérios problemas familiares e, em dado ponto, se vê sem nada e ninguém. Surge então o convite de trabalhar para Felipe, o qual aceita especialmente por questões materiais. Contudo, sua permanência é fruto de um laço de amizade ímpar que se constitui.
O longa dirigido por Marcos Carnevale (“Um amor à altura”) traz arquitetura similar ao de Eric Toledano e Oliver Nakache , mas com ritmo e linguagem muito diferentes. Ao passo que a versão francesa tem uma linguagem densa, tratando os dramas e relações uma atmosfera mais pesada, a versão Argentina mostra que temas assim podem (e por que não “deveriam”) ser tratados com leveza. A direção somada ao roteiro adaptado pelo diretor trazem a cena um senso de humor bobo, com ares caricatos na medida. O ritmo típico das produções argentinas (que às vezes lembravam de longe as novelas reprisadas por Silvio Santos) contam a história desta amizade em um tom diferenciado, e que, no final das contas, nos permite sair do cinema sem aquele peso na boca do estômago (como tão bem faz o cinema europeu).
O elenco conta no protagonismo com Oscar Martinez e Rodrigo De La Serna que abraçam a proposta. Rodrigo traz pra Tito um jeito um pouco pastelão que garante a pegada humorada, mas com pequenos exageros. O elenco, no mais, mostra trabalhos bem feitos salvo algumas exceções, que poderiam ter sido melhor preparadas (em especial os atores mais jovens).
A paisagisticamente rica Argentina também poderia ter sido melhor representada. Os contrastes entre as realidades (de Felipe e Tito) se apresenta na comparação entre o subúrbio pobre e a luxuosa mansão. No entanto, no mais, a cidade de Buenos Aires pouco se mostra no longa, o que é uma perda de uma boa oportunidade.
A trilha sonora também se encarrega de traçar o paralelo entre as realidades: o clássico e o popular se opõem em momentos específicos da trama. Mas no âmbito geral, a trilha possui um tom mais alto que o necessário, por destoar do ritmo da narrativa.
Inseparáveis soube aproveitar a deixa para tratar com tranquilidade um tema relevante, e traz um ensinamento importante para a educação social: Pessoas com Deficiência não são dignas de pena e não merecem ser tratadas como inferiores ou coitadas. Zelo e cuidado nunca foram sinônimos disso. As relações que envolvem deficientes são tão complicadas, lindas, complexas quanto aquelas que não envolvem. O tato de Tito com seu novo patrão gera um estranhamento inicial, mas é justamente a abordagem mais generosa e justa. Então que possamos fazer a vida imitar a arte e repensar nossas relações e condutas.
O longa, mesmo muito parecido com “Intocáveis” é uma opção bacana para toda a família. Sem esquecer da importância de conhecer e incentivar também o que se faz na (nossa linda e rica) América Latina.
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