Não é pequena a quantidade de obras concebidas no cinema sobre a Segunda Guerra Mundial. Desde o recente “Dunkirk” até o jovem clássico “Resgate do Soldado Ryan”, passando pelo irreverente “Bastardos Inglórios” e o pesado “A Lista de Shindler”, tal evento histórico parece sempre permear o imaginário social e ser combustível para a cultura pop. No entanto, talvez poucas sejam as produções parecidas com “Jojo Rabbit”, que se assume de cara como uma sátira ao nazismo. Se o nazismo e a ascensão da extrema-direita são assuntos tão sérios, será possível brincar com eles?
Taika Waititi, diretor do longa, então mostra que a comédia e os temas mais delicados não são necessariamente excludentes. No caso de “Jojo Rabbit”, tudo funciona devido ao olhar que é escolhido para ser colocado em tela, devido à ótica adotada. O grande acerto é o protagonismo nas mãos de uma criança, que busca sua própria aceitação dentro da sociedade em que está inserida e que ainda é muito presa aos valores do tempo em que nasceu. É interessante ver como funciona a desconstrução do nazismo e do ódio de sua ideologia a partir não só da comédia, mas do arco dramático de crescimento e amadurecimento de Jojo. Desde o princípio fica mais ou menos em evidência que o personagem principal é diferente do restante de sua sociedade e que, por conta de sua idade, é importante haver um descolamento daquilo que lhe foi ensinado como certo e indubitável. A mudança de perspectiva de Jojo é aquilo que vai acontecendo ao longo da projeção e que é muito convidativo ao espectador, já que muitas vezes acontece por meio de piadas e situações cômicas. Nesse sentido, a atuação de Roman Griffin Davis é certeira e até surpreendente tendo em vista sua idade.
As piadas, por outro lado, são eficientes não só por promoverem uma evolução dramática da trama e de seu protagonista como também por sua variação. Aqui há comédia física, non-sense, situacional e o riso é provocado até mesmo pela presença de músicas conhecidas em versões na língua alemã. Assim “I Want to Hold Your Hand” dos Beatles e “Heroes” de David Bowie surpreendem o público por estarem colocadas ali, e tanto por não serem canções datadas da Segunda Guerra Mundial como por estarem fora do idioma original em que foram gravadas. Aliás, a montagem também é ponto importante para o humor do filme funcionar, uma vez que seu timing não vem apenas de atuações e do roteiro, precisa de outros elementos funcionando em conjunto para que o efeito final seja maximizado.
Inclusive, o design de produção é muito feliz ao recriar uma Alemanha datada da década de 40, mas que não é idêntica ao que de fato existiu. Taika parece mais interessado em trabalhar com a sua leitura do nazismo, com a leitura da sátira que quer estabelecer do nazismo, e portanto opta por uma realidade que não é verossimilhante à que existiu. Desse modo, é possível reconhecer os símbolos e características do Terceiro Reich e entender que estes estão postos em cena com elementos de caricatura.
Se há um lado fraco em “Jojo Rabbit”, é a transição que é feita para momentos dramáticos. Mesmo que a comédia seja o gênero aqui escolhido, e isto esteja bem claro desde os primeiros momentos, “Jojo Rabbit” é mais sério do que se poderia esperar. Isso significa que em algumas sequências, sobretudo no terceiro ato, deixa o riso um pouco de lado em função de um apelo mais dramático e emocional também importante para a conclusão da história que está sendo contada. Isoladamente, essas partes até funcionam bem, mas que são problemáticas em termos de conexão com o resto. Taika Waititi domina muito bem a comédia, a satária e faz isso com perspicácia e inteligência, mas não soube lidar tão bem com a transição disso para aquilo que é mais denso, mais carregado de força sentimental.
Imagens e Vídeo: Divulgação/20th Century Studios Brasil
Quer estar por dentro do que acontece no mundo do entretenimento? Então, faça parte do nosso CANAL OFICIAL DO WHATSAPP e receba novidades todos os dias.