O filme “Judy – Muito Além do Arco-Íris”, dirigido por Rupert Goold, entrega o básico do que se espera de uma cinebiografia: a vida cheia de obstáculos, vitórias e derrotas de Judy Garland, a eterna Dorothy de “O Mágico de Oz”. O roteiro de Tom Edge, baseado na peça teatral “End of the Rainbow” de Peter Quilter, conta a história da atriz e cantora em seus momentos crepusculares, quando não era mais tão requisitada nos EUA. Para fazer dinheiro e conseguir pagar os advogados que a representariam em um processo da guarda de seus dois filhos pequenos, disputada com um de seus vários ex-maridos, Judy Garland aceita fazer uma série de shows em Londres, onde ainda era muito admirada e respeitada.
É durante a turnê que são expostos os sofrimentos da artista, como a insônia, o vício em remédios e em bebida, e a depressão. Tudo justificado por uma infância que, apesar de todo sucesso, foi predominantemente ocupada pelos afazeres profissionais impostos por Louis B. Mayer, um dos fundadores da Metro-Goldwyn-Mayer na década de 30. Além disso, Garland não teve os pais presentes, que praticamente a venderam à Mayer. Ela se dedicava ao trabalho, e vivia em uma espécie de cárcere privado, sem amigos ou diversões reais. A primeira cena do longa, inclusive, mostra a garota em um backstage escuro, enquanto olha a representação de um campo ensolarado reproduzido pelos refletores e cenários. Um simulacro de vida que era a única realidade que ela conhecia.
Cenas de infância como essa se repetem durante o filme por meio de flashbacks, mas é na problemática fase adulta que as atenções se voltam. Claro que a montagem de Melanie Oliver faz os paralelos entre o que aconteceu no passado com as consequências do presente, levando o espectador a comparar a Garland jovem, ingênua e cheia de vida, interpretada decentemente por Darci Shaw, com a paranoica, melancólica e envelhecida Garland de Renée Zellweger. Com a volta Zellweger aos principais holofotes hollywoodianos, é até possível notar a similaridade entre a fase posterior de sua carreira – antes deste “Judy – Muito Além do Arco-Íris” – com os momentos finais da Garland do filme. Talvez, até seja por isso que ela tenha escolhido o papel, mas esse é outro assunto, já que a proposta deste texto é unicamente de analisar a obra.
Pois bem, com isso, é possível dizer que o melhor elemento que “Judy – Muito Além do Arco-Íris” possui é a atuação de sua protagonista. Zellweger reproduz com exatidão os trejeitos de Garland no palco, como os olhos arregalados que olham o vazio por cima da plateia, e a forma insegura com que canta as suas famosas canções. Parece que, a qualquer instante, ela largará o microfone e fugirá dos shows – isso, de fato, acontece em uma cena do terceiro ato. Cada música se torna um fardo que precisa carregar, afinal, são elas que a lembram da infância destruidora. O passado a assombra, e a arte se transforma em seu maior pavor. Isso é tão aparente que sua saúde mental e física vai se deteriorando após cada apresentação. Até a capacidade de andar é prejudicada, por isso a envergadura do corpo é aparente. Todo esse processo é divinamente construído por Zellweger, levando a crer que Oscar de atuação feminina já tem dona.
Para ajudar na performance de sua intérprete, Goold e seu diretor de fotografia Ole Bratt Birkeland, desenvolvem elementos para expor o esvaecimento de Garland, como quando ela é enquadrada em primeiro plano, sem nenhum tipo de profundidade de campo. O que se vê nesses momentos é a personagem de costas para um horizonte cheio de pontos luminosos que parecem estrelas em um céu desfocado. A fama, o sucesso, e o talento de uma diva serão apagados das memórias enquanto o impassível tempo toma conta de seu corpo.
Imagens e Vídeo: Divulgação/Paris Filmes
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