Para assistir as mais de duas horas de “Liberté”, é preciso uma boa porção de paciência e, principalmente, estômago forte, já que o cineasta Albert Serra constrói seu filme de forma lenta e não esconde as bizarrices que alguns nobres, expulsos da corte de Louis XVI, realizam para satisfazer seus desejos libertinos. Após fugirem da França, eles se instalam em uma floresta e pedem a ajuda de um duque Alemão, que compartilha de suas predileções sexuais. Usando apenas as cabines de suas carruagens aristocráticas e as roupas e perucas que lhe sobraram do passado, eles recriam a sórdida corte da qual se acostumaram a viver nos anos de bonança. A vida na natureza não poderia ser mais adequada a esses animais selvagens, que buscam suas últimas caças antes que a revolução de 1789 acabe com suas existências hedonistas.
Os personagens do roteiro escrito pelo próprio Serra são como aqueles libertinos inveterados das obras do Marquês de Sade. Ou seja, as perversões são consequências da natureza humana, que até são escondidas em sociedades ditas civilizadas, mas que que são liberadas ao cair da noite. As críticas à nobreza perpetradas por Sade estão presentes em “Liberté” através do estudo desses personagens mergulhados na escuridão da fotografia de Artur Tort. Os poucos feixes de luz que o fotógrafo lança nas cenas servem apenas para que o espectador consiga enxergar aqueles homens e mulheres em momentos doentios de prazer. Momentos esses que, às vezes, excluem o sexo em prol da dor e da sujeira.
Com a crueza e o grafismo das imagens, é difícil não virar os olhos durante a projeção, porém seria injusto reprová-las, já que o objetivo do filme é o de criar um zoológico humano e não de romantizar os desejos. Agora, como dito no início do texto, a paciência é uma virtude a ser exercitada, isso porque Serra não segue um fio narrativo, ele apenas recorta sua obra em cenas que mostram a escalada da libertinagem, que vai de golden showers a torturas. Sem uma trama para acompanhar, o tédio não tarda a aparecer no meio do grotesco filmado em planos estáticos. Os pouco movimentos que se vê são os dos zooms nos órgãos genitais e em membros amputados sendo fustigados.
Realmente, como esses elementos, “Liberté” não agradará a todos, o que o prejudicará em sua carreira nos cinemas. Pode-se dizer que não é fácil gostar de tudo o que é apresentado, justificando prováveis abandonos de sessões por aqueles mais sensíveis. Talvez, tamanhas barbaridades sejam difíceis de ver em tela grande porque elas despertam nas pessoas algumas fantasias ocultas que são vergonhosas de se admitir. Por outro lado, o filme poderá ser visto apenas como uma peça que tenta ser subversiva, porém sem atingir um grande nível, o que o transformará em um mísero objeto de curiosidade. De qualquer maneira, seu objetivo, assim como toda forma de arte, será alcançado quando as discussões e reflexões começarem após a subida dos créditos.
Vídeo e Imagens: Divulgação/ Zeta Filmes
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