Saboreando descobertas
Seres humanos são diversos em muitos aspectos, mas todos certamente querem ser amados. Alguns, por conta de limitações físicas, recebem um olhar diferente por parte da sociedade. São chamados de portadores de necessidades especiais; mas além dessas, possuem também as outras necessidades comuns a todos, sem distinção. “Margarita com canudinho” toca em preconceitos e tabus com uma leveza rara nesse tipo de filme. Não é demagógico nem panfletário. Mostra com simplicidade o cotidiano de uma jovem que tem paralisia cerebral, sua família, seus amigos e deixa bem claro: Laila (Kalki Koechlin) tem desejos como qualquer outra jovem.
A história se passa em Deli, na Índia, onde Laila estuda. Embora conte com a ajuda da mãe, é bastante independente ao se deslocar em uma cadeira motorizada e se alimentar sozinha. A personalidade da jovem é envolvente: é alguém dotada de bom humor, mas que sabe responder à altura se a tratam com condescendência. Além disso, não tem medo de tomar a iniciativa com os rapazes nem de demonstrar seu interesse. Claro que isso não impede que sofra quando é rejeitada.
Em certa altura, Laila é aceita na Universidade de Nova York e viaja para os Estados Unidos com a mãe, que lhe faz companhia por algum tempo. Lá, conhece Khanum (Sayani Gupta), deficiente visual, em uma manifestação que acaba dispersada pela polícia com o uso de bombas. Tornam-se amigas e Kahnum passa a ter um papel importante na jornada de autodescoberta de Laila.
Khanum é bonita e sensual; veste-se com estilo e muitas cores, usa maquiagem e acessórios. Seu apartamento também é decorado com bom gosto e objetos que criam aconchego, como almofadas e velas, sempre com muita cor. Tudo isso transmite a mensagem de que o fato de não enxergar não é motivo para que ela – ou qualquer outra pessoa com deficiência visual – não se interesse pela sua própria aparência.
A fotografia destaca a paisagem de Nova York no inverno, mas não chega a ser um elemento relevante no filme. Aqui, o foco está no enredo. Importam mais a história e os personagens, evidentemente com ênfase na trajetória de Laila. A trilha sonora de Mikey McCleary apresenta uma bela música instrumental que permeia várias cenas do longa. Uma canção indiana muito animada também leva a família da jovem a dançar junto – levada por ela. A família em questão, aliás, tem um carisma que nos faz querer fazer parte de um núcleo tão afetuoso. A atriz Revathi, que interpreta a mãe, se sobressai mais que Kuljeet Singh e Malhar Khushu, respectivamente nos papéis de pai e irmão. Isso se deve a questões de roteiro, que a colocam em maior destaque, mas todas as interpretações são boas e a família transmite união e afeto, sem entrar na perfeição enganosa que conhecemos dos anúncios de margarina.
A atriz Kalki Koechlin nasceu na Índia, filha de hippies franceses que se mudaram para lá em 1970 por serem devotos do guru Sri Aurobindo. Kalki estudou artes dramáticas em Londres, mas depois decidiu trabalhar no cinema indiano e foi premiada várias vezes. Também atua em teatro, não apenas como atriz, mas escrevendo e produzindo. Para realizar “Margarita com canudinho” passou por seis semanas de treinamento.
A diretora e roteirista Shonali Bose fez um belo filme que merece ser visto e divulgado. A atmosfera do longa é bastante positiva, retratando Laila e Khanum como pessoas com desejos amorosos e sexuais e que têm uma vida: estudam, produzem, praticam esportes, viajam. A limitação física não as define. Além de ser uma história bem contada, é um caminho para combater a discriminação de pessoas com deficiência e promover a inclusão.
Neuza Rodrigues
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