“Pé pequeno”, o novo filme animado da Warner Bros, mostra a história de Migo um yeti que vive em uma vila de yetis (ou Pés-grandes) no alto de uma montanha, onde acredita-se que o mundo tenha vindo do traseiro de um iaque. Que abaixo das nuvens, que rodeiam o lugar, não há nada e que o sol é, na verdade, um grande caracol que precisa ser acordado toda manhã por um gongo – função essa, desempenhada pelo seu pai (e almejada por ele), que há anos catapulta-se com uma pedra amarrada na cabeça a fim de soá-lo. A autoridade local está na figura do Guardião das pedras, pedras essas que detém todo o suposto conhecimento daquela sociedade e que jamais podem ser contestadas, por isso o Guardião acaba desempenhando a função de líder político e religioso.
Na tentativa de executar a função de seu pai, Migo acaba distraindo-se por Meechee (filha do Guardião das pedras) e errando o gongo, caindo mais afastado e tendo um encontro inesperado com um ser humano, ou pé-pequeno – como ele o chama -, um aviador que sofreu um acidente próximo e acaba sendo levado pelo vento graças ao seu paraquedas. Eufórico com a descoberta, o protagonista não perde tempo e conta para as pessoas da vila o que acabou de acontecer, porém o vento e a neve acabam encobrindo sua prova cabal, o avião, antes que alguém a visse. Em descrédito, mas sem abrir mão do que viu, Migo acaba é banido pelo Guardião das pedras, já que seu relato vai de encontro aos dogmas daquela sociedade.
Repare na neve no momento do banimento, antes branquinha e acolhedora, aqui fica cinzenta, que em conjunto com um plano mais aberto, deixando o personagem pequeno no quadro, confere uma atmosfera de desolação que o momento precisava. O antagonismo do Guardião também está representado visualmente, seus chifres são grandes e pontiagudos, ao contrário dos chifres de outros yetis (que são pequenos e mais arredondados). Formas pontiagudas são frequentemente usadas na caracterização de vilões, é só lembrar do chapéu e nariz na imagem tradicional de uma bruxa, ou no tridente e chifres na imagem do diabo construída pela igreja. Além disso, o personagem traz uma camada interessante no subtexto, já que detém todo o conhecimento, contudo usa do medo e da desinformação para controlar seu povo (parece familiar?).
Migo, agora um pária, é acolhido por um grupo de yetis contestadores liderados por Meechee, com o aval do grupo ele parte em busca de um pé-pequeno além das nuvens da montanha, assim, acaba encontrando o humano Percy, dono de um programa sobre animais que já teve uma certa glória em um passado recente e agora está em decadência, fazendo o apresentador recorrer à apelação na tentativa de retomar a fama. A interação entre o protagonista e Percy é um dos pontos altos do filme, a incomunicabilidade de ambos e a ignorância que um tem sobre o outro, rendem as melhores piadas do longa. Há diversos números musicais na produção, que servem para nos apresentar algo ou dar mais ritmo à narrativa, alguns funcionam bem, mesmo expositivos é perdoável levando em conta o público alvo, porém alguns repercutem de forma desnecessária – como é o caso da paródia de “under pressure”. A cena está ali para nos mostrar a vida pregressa de Percy e a motivação na suas recentes ações, porém isso já havia ficado claro em um diálogo anterior, no qual discutia com sua assistente.
O terceiro ato tem algumas viradas apressadas, dando a impressão que alguns personagens mudaram de uma hora para outra, e mesmo com o final satisfatório o clímax não é tão forte. “Pé pequeno” é um filme que vai divertir e entreter as crianças e boa parte dos adultos, mesmo esses ficando com uma sensação de déjà vu, já que o filme segue uma narrativa tradicional e não traz nada de novo em relação a outros filmes parecidos. Seus personagens são carismáticos o suficiente para fazer o público se importar, sem falar na importante mensagem que fica ao mostrar o questionamento de certas práticas e tradições, e como esse questionamento é essencial para nosso crescimento como sociedade, e que a verdade – como é dito pelo personagem principal – pode ser complicada e assustadora, mas é melhor que a mentira. Uma lição importante nesses tempos.
Por Augusto Dias
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